terça-feira, junho 28, 2005


Ao ler o site "Reconquista" deparei-me com uma passagem do épico de Alexandre Herculano, "Eurico, o presbítero", a história imortal do amor impossível de Eurico e Hermengarda e do início da reconquista da Ibéria ao invasor quando já pouca esperança restava, quando muitos haviam já vendido a pátria ao ocupante e se submetido à sua vontade, quando apenas uns poucos bravos continuavam a luta, liderados pela coragem inabalável de Eurico, o guerreiro misterioso do Chrysus, que abandonara o presbitério para acorrer ao derradeiro chamamento da pátria. Este excerto retirado do "Reconquista" relata o último combate de Eurico, antes de cair para não mais se erguer.

«Era quase ao pôr do sol. Seguindo a corrente do Deva, a pouco mais de duas milhas das encostas do Auseba, dilatava-se nessa época denso bosque de carvalhos, no meio do qual se abria vasta clareira, onde sobre dois rochedos aprumados assentava um terceiro. Era, provavelmente, uma ara céltica. Em frente da tosca ponte de pedras brutas lançadas sobre o rio, uma senda estreita e tortuosa atravessava a selva e, passando pela clareira, continuava por meio dos outeiros vizinhos, dirigindo-se, nas suas mil voltas, para as bandas da Galécia. Quatro cavaleiros, a pé e em fio, caminhavam por aquele apertado carreiro. Pelos traios e armas, conhecia-se que eram três cristãos e um sarraceno. Chegados à clareira, este parou de repente e, voltando-se com aspecto carregado para um dos três, disse-lhe:

- Nazareno, ofereceste-nos a salvação, se te seguíssemos: fiamo-nos em ti, porque não precisavas de trair-nos. Estávamos nas mãos dos soldados de Pelágio, e foi a um aceno teu que eles cessaram de perseguir-nos. Porém o silêncio tenaz que tens guardado gera em mim graves suspeitas. Quem és tu? Cumpre que sejas sincero, como nós. Sabes que tens diante de ti Muguite, o amir da cavalaria árabe, Juliano, o conde de Septum, e Opas, o bispo de Ríspalis.

- Sabia-o - respondeu o cavaleiro: - por isso vos trouxe aqui. Queres saber quem sou? Um soldado e um sacerdote de Cristo!

- Aqui!?... - atalhou o amir, levando a mão ao punho da espada e lançando os olhos em roda. - Para que fim?

- A ti, que não eras nosso irmão pelo berço; que tens combatido lealmente conosco, inimigos da tua fé; a ti, que nos oprimes, porque nos venceste com esforço e à luz do dia, foi para te ensinar um caminho que te conduza em salvo às tendas dos teus soldados. É por ali!... A estes, que venderam a terra da pátria, que cuspiram no altar do seu Deus, sem ousarem francamente renegá-lo, que ganharam nas trevas a vitória maldita da sua perfídia, é para lhes ensinar o caminho do inferno... Ide, miseráveis, segui-o!

E quase a um tempo dois pesados golpes de franquisque assinalaram profundamente os elmos de Opas e Juliano. No mesmo momento mais três reluziram.

Um contra três! - Era um combate calado e temeroso. O cavaleiro da cruz parecia desprezar Muguite: os seus golpes retiniam só nas armaduras dos dois godos. Primeiro o velho Opas, depois Juliano caíram.»

Leitura altamente recomendada, sobretudo nos tempos que correm.

18 Comentários:

Blogger Rodrigo N.P. disse...

Tem bom gosto.Vitorino Nemésio escreveu sobre esta obra de Herculano:

«...Um livro português de irradiação talvez só comparável à que "Os Lusíadas" conheceram, guardadas as devidas proporções do género, grandeza e lugar, na essência da nação, como vade-mécum dos seus filhos.»

12:15 da manhã  
Blogger Caturo disse...

Excelente obra, sem dúvida. Romantismo patriótico ibérico no seu melhor.

1:41 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

Sem dúvida excelente e, como ele é tão actual nos nossos dias!
Isso leva-me a pensar em outros textos do autor, por exemplo em Lendas e Narrativas, por exemplo:
-O ALCAIDE DO CASTELO DE FARIA
-A MORTE DO LIDADOR
DO MELHOR NA NOSSA LITERATURA EM QUE O ROMANTISMO E O AMOR PÁTRIO SE ENTRELAÇAM. Honra, bravura, lealdade, entrega total aos valores da Pátria e total entrega para a sua defesa; coisas raras nos nossos dias e que devem ser reatadas a todo o custo.

2:16 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

É um livro com uma escrita belíssima e uma leitura recomendável. Li-o nos meus tempos de liceu e já o reli 2 vezes.
Boa escolha do excerto!
Alexandre Herculano conseguiu captar e transmitir, como poucos, a noção de patriotismo.

Cumprimentos.

10:53 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

Amigo Rebatet, com este artigo fazes os portugueses de raiz sentirem a voz do sangue, impelindo-nos para a RECONQUISTA do nosso solo sagrado, o qual queremos que seja dos nossos filhos, tal como foi dos nossos pais. Não permitiremos que o pé estrangeiro pise a campa dos nossos antepassados!

11:38 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

Só uma pergunta... Este é o mesmo Alexandre Herculano que dizia que os Árabes tinham sido "a jóia da Península", e praticamente um dos nossos primeiros arabistas modernos? A sério pá, eu gostava de saber.

8:12 da tarde  
Blogger Rodrigo N.P. disse...

Alexandre Herculano, enquanto historiador, foi um dos que mais se interessou pela ocupação árabe da Península,e é nesse sentido que é considerado um "arabista", daí até a maior força que ganha a caracterização que Herculano faz dos invasores no romance.Note-se que são descritos como animalescos e a eles se contrapõe a virtude original goda que, nos resistentes, sobrevivera à decadência generalizada .

Percebeste...pá?

Mas eu até compreendo que a ti este épico te desagrade, te repugne ou até que sejas incapaz de rever os teus antepassados naquelas páginas, compreendo e muito bem...pá.

10:38 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

É óbvio que você não sabe nada de Herculano, e apenas aproveita, selectivamente, o que lhe convém. Neste caso, um belíssimo romance histórico como o "Eurico", para instigar ódio à moirama, o que parece grotesco e obsceno. Vá ler o que o grande Herculano escreve antes de dizer disparates como estes. O "animalesco", aqui, está na sua cabeça. Quanto aos Árabes, Herculano chamou-os de "jóia" da Península, e possivelmente vê-los-ia como a mais refinada e tolerante cultura que por cá passou. Dizer isto não é ser anti-patriota ou amante de Mafoma. É apenas não ser estúpido.

11:42 da tarde  
Blogger Rodrigo N.P. disse...

Ó idiota, eu referia-me à descrição feita por Herculano em particular nesta obra, onde os árabes são caracterizados como gente sem escrúpulos e de comportamento animalesco.Vá ler o livro.Entretanto sublinho que o excerto reproduzido é dirigido precisamente a gente como você.

2:52 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

Concedo ao VC que Herculano considerava a cultura árabe avançada e que a admirava. Mas apenas em termos culturais. A detalhada descrição que Herculano faz da história dos árabes na Península é um rol de traições e desonras. Além disso, se Herculano os achasse tão tolerantes não colocava no seu livro cenas como a do convento (que é verídica, mas passou-se num período posterior ao séc. VIII) nem os descrevia com tamanha bestialidade. Típico exemplar da esquerda que tem a mania que todos os outros são ignorantes, VC revela uma profunda ignorância ao, ele sim, analisar o pensamento de Herculano apenas pelo lado que lhe dá jeito. E, para dar pala de sabichão, afirma arrogantemente: vão ler, seus ignorantes. Ora, eu li. Eurico já li umas quatro vezes. E de fio a pavio já li também uma obra que ainda hoje me acompanha e que herdei da biblioteca de meu avô: chama-se "História de Portugal", o autor é Alexandre Herculano (talvez não o mesmo a que o VC se refere, a julgar pelos disparates que o VC debita), edição de 1918, em 8 volumes. Penso que será válida... A menos que VCs e BEs se guiem por uma nova versão censurada e revista, talvez pelo Fumando Brocas. Por isso, a haver aqui ignorância é do VC e há que retribuir o cumprimento: vai TU ler, o ignorante és TU e a táctica de vir chamar ignorante a quem não pensa como tu é um estrategema vosso que já não pega, pois só esconde a vossa ignorância ao tentarem desesperadamente colocarem-se num patamar acima, do qual se verifica depois que caem com a maior das facilidades. Mas, por acaso, até me considero ignorante. Não sei nem metade daquilo que gostaria de saber e conhecer, dado este Mundo ser tão vasto em ciências, lugares e ideias. Mas de História e Literatura poucos me dão lições, principalmente asnos como tu.

4:20 da tarde  
Blogger Caturo disse...

Ora o anónimo das 4:20 já deu o correctivo necessário ao VC, que se estava a portar mal.

No entanto, não deixa de ser inquietante e, para os mais decididos, motivante, o facto de que os gajos como VC estão por toda a parte da comunicação sucial e da (des)educação. E querem ter o monopólio da informação, é só por isso que tentam silenciar os nacionalistas.

Por isso, a vergasta com que o anónimo das 4:20 pôs o VC no seu devido lugar, tem de ser exibida em público, e, por isso, urge desenvolver esforços no sentido de dinamizar uma propaganda que alcance o maior número possível de pessoas, sobretudo as crianças em idade escolar, hoje completamente à mercê dos VCs deste mundo.

6:50 da tarde  
Blogger Caturo disse...

Quanto à posição de Alexandre Herculano sobre os Mouros, seria, na melhor das hipóteses, a do respeito pelo inimigo. Chama-se cavalheirismo. Isso pode ler-se no conto «A Morte do Lidador», em «Lendas e Narrativas».

Do que não há dúvida é que Herculano glorificava sempre o esforço bélico dos Hispano-Romanos na sua luta pela Reconquista da Ibéria.

De resto, não sei se o historiador em questão disse que os Mouros eram tolerantes, mas, se disse, enganou-se. A intolerância religiosa inerente ao Islão está bem expressa no próprio Alcorão, sem apelo nem agravo.

6:54 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Prezo que a citação que fiz no meu site (agora, no endereço: www.reconquista.do.sapo.pt)e cuja reprodução no BATALHA FINAL me lisonjeia, tenha originado esta interessante discussão que teve como mais notório resultado por os pontos nos ii de um VC/PC. parabéns ao magistral anonymous.

11:16 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

Sobre la moraima, muy interesante el libro "Los Baños de Argel" de Miguel de Cervantes Saavedra.

7:32 da manhã  
Blogger Roberto Iza Valdés disse...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

12:53 da tarde  
Blogger Roberto Iza Valdés disse...

Este comentário foi removido por um gestor do blogue.

8:27 da tarde  
Anonymous Anónimo disse...

ao ir ao encontro dos inimigos,o cavaleiro tem um plano em mente. qual é esse plano?

12:13 da manhã  
Anonymous Anónimo disse...

e durante o combate,o cavaleiro da cruz,Eurico,"parecia desprezar muguite"por que Eurico procendia desse modo?

12:16 da manhã  

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