Contra a democracia (não)representativa e a partidocracia
A visão da associação “Synergies Européennes” é democrática mas hostil a todas as formas de partidocracia, porque esta, que se pretende democrática, é na realidade a perfeita negação de democracia. No plano teórico a “Synergies Européenes” referencia um liberal russo do início do século XX, militante do Partido dos Cadetes: Moshe Ostrogovski. A análise que este liberal russo de antes da revolução bolchevique nos deixou assenta numa constatação evidente: Toda a democracia deveria ser um sistema imitando o movimento das coisas na Cidade. Os mecanismos eleitorais procuram logicamente dar representação às efervescências que actuam na sociedade, dia a dia, sem subverter de forma alguma a ordem imutável da política. Como consequência, os instrumentos de representatividade, isto é, os partidos políticos, devem também representar as efervescências que vão acontecendo e nunca procurar a eternização. O mau funcionamento da democracia parlamentar advém do facto dos partidos políticos se tornarem uma presença rigidamente permanente dentro da sociedade, englobando mais e mais gente medíocre nas suas fileiras. De forma a colocar um fim a este inconveniente Ostrogovski sugere que a democracia assente em partidos “ad hoc”, reclamando pontualmente reformas urgentes ou ajustes precisos, proclamando depois a sua própria dissolução para libertar o seu pessoal, que pode posteriormente forjar novos movimentos peticionários, permitindo redistribuir as cartas e repartir os militantes por novas formações que serão também provisórias. Os parlamentos acolheriam assim cidadãos que nunca se ancorariam no profissionalismo político. Os períodos de legislatura seriam também mais curtos ou, como no início da história da Bélgica ou no Reino Unido dos Países Baixos de 1815 a 1830 , um terço da assembleia seria mudada a cada terça parte da legislatura, permitindo uma rotatividade acelerada do pessoal político e a eliminação, sancionada pelas urnas, de todos os que se mostrem incompetentes, esta rotatividade não existe hoje, o que, aparte o problema do voto recenseado, nos dá hoje uma democracia menos perfeita que à época. O problema é evitar carreiras políticas de indivíduos que não conhecerão nada da vida civil real.
Max Weber fez também observações pertinentes: ele constata que os partidos socialistas e democratas-cristãos (o centrão) instalam personagens sem competência em lugares chave, que tomam decisões sem qualquer bom-senso, animados pela ética da “convicção” em vez da ética da responsabilidade e exigindo a divisão de postos políticos ou civis em função de simples rácios de votos, sem terem de provar a sua competência no desempenho dos cargos. O ministro liberal italiano do século XIX, Minghetti, percebeu muito rapidamente como este sistema poria um fim à separação dos 3 poderes, já que os partidos e os seus militantes, armados da sua ética da convicção, fonte de todas as demagogias, quereriam controlar e manipular a justiça e destruir qualquer compartimentação entre o legislativo e o executivo. O equilíbrio democrático entre os 3 poderes, colocados à partida como estanques de forma a garantir a liberdade dos cidadãos, como definido por Montesquieu, não pode mais nem funcionar nem existir num tal contexto de histeria e demagogia. É aí que estamos.
A “Synergie Européennes” não critica portanto a instituição parlamentar em si, mas mostra claramente a sua aversão a qualquer disfuncionalidade, a toda a intervenção privada( os partidos são na realidade associações privadas, como lembra Ostrogovski) no recrutamento de pessoal político, de funcionários, etc.,a qualquer tipo de nepotismo(cooptações de membros da família de um político ou funcionário para um posto político ou administrativo).Apenas a avaliação por um júri totalmente neutro deveria permitir o acesso a um cargo. Qualquer outro método de recrutamento deveria constituir um delito muito grave.
Também pensamos que os parlamentos não deveriam ser simples câmaras representativas onde se sentam membros escolhidos de partidos políticos( logo de associações privadas que exigem disciplina sem autorizar geralmente qualquer direito de tendência ou iniciativa pessoal dos deputados). Nem todos os cidadãos são membros de um partido, de facto a maioria não tem qualquer filiação partidária. Consequentemente os partidos não representam usualmente mais que 8 a 10% da população e 100% do parlamento! O peso excessivo dos partidos deveria ser corrigido por uma representação saída de associações profissionais e sindicatos como defendia De Gaulle e a sua equipa quando falavam de “ Senado de profissões e regiões”. Para o professor Bernard Willms( 1931-1991) o modelo constitucional mais desejável alicerçar-se-ia numa assembleia de 3 câmaras( Parlamento, Senado e Câmara económica). Metade do Parlamento seria recrutado entre candidatos propostos pelos partidos e eleitos pessoalmente, a outra metade seria composta por representantes das corporações e associações profissionais. O Senado seria essencialmente um órgão de representação regional( como o Bundesrat alemão ou austríaco). A Câmara económica, igualmente organizada numa base regional, representaria os corpos sociais, entre os quais os sindicatos.
O problema consiste em consolidar uma democracia assente nos “corpos concretos” da sociedade e não unicamente em associações privadas de natureza ideológica e arbitrária, como os partidos. Esta ideia aproxima-se da definição dada por Carl Schmitt dos “corpos concretos”. No entanto, toda a entidade política baseia-se num património cultural, que deve ser tomado em consideração, de acordo com a análise feita por um discípulo de Carl Schmitt, Ernst Rudolf Huber. Para Huber, o Estado coerente é sempre um Kulturstaat( Estado cultural), e o aparelho de Estado tem o dever de preservar esta cultura, expressão de uma Sittlichkeit ( etnia), excedendo os simples limites da ética de forma a incluir uma variedade de campos de produção artística, cultural, estrutural, agrícola, industrial, etc., cuja fecundidade deve ser preservada. Uma representação mais diversificada, que vá para lá desses 8 a 10% de filiados partidários, permite justamente melhor garantir essa fecundidade, distribuída por todo o corpo social da nação. A defesa dos “corpos concretos” postula a trilogia “comunidade, solidariedade, subsidiariedade”, a resposta conservadora, no século XVIII, ao projecto de Bodin, visando destruir os corpos intermédios da sociedade, isto é, os “corpos concretos”, deixando o cidadão-indivíduo isolado face ao Leviathan Estatal. As ideias de Bodin foram realizadas pela Revolução francesa e o seu sonho de geometrização da sociedade, que começou precisamente pela erradicação das associações profissionais pela Lei Le Chapelier de 1791.Hoje em dia o recurso actualizado à trilogia “comunidade, solidariedade, subsidiariedade” implica dar o máximo de representatividade às associações profissionais, ao povo real, e reduzir o arbítrio dos partidos e funcionários.
Tradução livre de um excerto de uma entrevista a Robert Steuckers, presidente da associação "Synergies Européennes", conduzida por Pieter Van Damme.
Max Weber fez também observações pertinentes: ele constata que os partidos socialistas e democratas-cristãos (o centrão) instalam personagens sem competência em lugares chave, que tomam decisões sem qualquer bom-senso, animados pela ética da “convicção” em vez da ética da responsabilidade e exigindo a divisão de postos políticos ou civis em função de simples rácios de votos, sem terem de provar a sua competência no desempenho dos cargos. O ministro liberal italiano do século XIX, Minghetti, percebeu muito rapidamente como este sistema poria um fim à separação dos 3 poderes, já que os partidos e os seus militantes, armados da sua ética da convicção, fonte de todas as demagogias, quereriam controlar e manipular a justiça e destruir qualquer compartimentação entre o legislativo e o executivo. O equilíbrio democrático entre os 3 poderes, colocados à partida como estanques de forma a garantir a liberdade dos cidadãos, como definido por Montesquieu, não pode mais nem funcionar nem existir num tal contexto de histeria e demagogia. É aí que estamos.
A “Synergie Européennes” não critica portanto a instituição parlamentar em si, mas mostra claramente a sua aversão a qualquer disfuncionalidade, a toda a intervenção privada( os partidos são na realidade associações privadas, como lembra Ostrogovski) no recrutamento de pessoal político, de funcionários, etc.,a qualquer tipo de nepotismo(cooptações de membros da família de um político ou funcionário para um posto político ou administrativo).Apenas a avaliação por um júri totalmente neutro deveria permitir o acesso a um cargo. Qualquer outro método de recrutamento deveria constituir um delito muito grave.
Também pensamos que os parlamentos não deveriam ser simples câmaras representativas onde se sentam membros escolhidos de partidos políticos( logo de associações privadas que exigem disciplina sem autorizar geralmente qualquer direito de tendência ou iniciativa pessoal dos deputados). Nem todos os cidadãos são membros de um partido, de facto a maioria não tem qualquer filiação partidária. Consequentemente os partidos não representam usualmente mais que 8 a 10% da população e 100% do parlamento! O peso excessivo dos partidos deveria ser corrigido por uma representação saída de associações profissionais e sindicatos como defendia De Gaulle e a sua equipa quando falavam de “ Senado de profissões e regiões”. Para o professor Bernard Willms( 1931-1991) o modelo constitucional mais desejável alicerçar-se-ia numa assembleia de 3 câmaras( Parlamento, Senado e Câmara económica). Metade do Parlamento seria recrutado entre candidatos propostos pelos partidos e eleitos pessoalmente, a outra metade seria composta por representantes das corporações e associações profissionais. O Senado seria essencialmente um órgão de representação regional( como o Bundesrat alemão ou austríaco). A Câmara económica, igualmente organizada numa base regional, representaria os corpos sociais, entre os quais os sindicatos.
O problema consiste em consolidar uma democracia assente nos “corpos concretos” da sociedade e não unicamente em associações privadas de natureza ideológica e arbitrária, como os partidos. Esta ideia aproxima-se da definição dada por Carl Schmitt dos “corpos concretos”. No entanto, toda a entidade política baseia-se num património cultural, que deve ser tomado em consideração, de acordo com a análise feita por um discípulo de Carl Schmitt, Ernst Rudolf Huber. Para Huber, o Estado coerente é sempre um Kulturstaat( Estado cultural), e o aparelho de Estado tem o dever de preservar esta cultura, expressão de uma Sittlichkeit ( etnia), excedendo os simples limites da ética de forma a incluir uma variedade de campos de produção artística, cultural, estrutural, agrícola, industrial, etc., cuja fecundidade deve ser preservada. Uma representação mais diversificada, que vá para lá desses 8 a 10% de filiados partidários, permite justamente melhor garantir essa fecundidade, distribuída por todo o corpo social da nação. A defesa dos “corpos concretos” postula a trilogia “comunidade, solidariedade, subsidiariedade”, a resposta conservadora, no século XVIII, ao projecto de Bodin, visando destruir os corpos intermédios da sociedade, isto é, os “corpos concretos”, deixando o cidadão-indivíduo isolado face ao Leviathan Estatal. As ideias de Bodin foram realizadas pela Revolução francesa e o seu sonho de geometrização da sociedade, que começou precisamente pela erradicação das associações profissionais pela Lei Le Chapelier de 1791.Hoje em dia o recurso actualizado à trilogia “comunidade, solidariedade, subsidiariedade” implica dar o máximo de representatividade às associações profissionais, ao povo real, e reduzir o arbítrio dos partidos e funcionários.
Tradução livre de um excerto de uma entrevista a Robert Steuckers, presidente da associação "Synergies Européennes", conduzida por Pieter Van Damme.
10 Comentários:
"Metade do Parlamento seria recrutado entre candidatos propostos pelos partidos e eleitos pessoalmente, a outra metade seria composta por representantes das corporações e associações profissionais. O Senado seria essencialmente um órgão de representação regional( como o Bundesrat alemão ou austríaco). A Câmara económica, igualmente organizada numa base regional, representaria os corpos sociais, entre os quais os sindicatos."
Porque não?!
A grande vantagem da Democracia é que existem várias maneiras, bem diferentes, de a organizar.
Em última análise, os partidos não são indispensáveis à Democracia.
O sufrágio universal a eleição directa também NÃO são indispensáveis à Democracia.
Como a experiência demonstra.
Além de Ostrogorski, também Michels fez uma critica implacavel à democracia de partidos (curiosamente Michels, que começou no SPD, acabou adepto do fascismo).
Olha o Buiça a defender o corporativismo [inserir smiley espantado]! O Rebatet é que tem razão, seu facho-liberal!
NC
Covido-os a ler, entre outras coisas interessantes (e picantes) o texto:
Lista das Oito Centenas de Milhar de Cidadãos a "Expropriar" pelo Estado, Onde Devem Estar Algumas Dezenas que até Mereciam
disponível no meu blog ORTOGAL
www.oortogal.blogspot.com
Saudações bloguísticas ao Batalha Final, que muito aprecio.
Valdemar Rodrigues
Era só dizer que tenho um blog cujo nome é Pátria e com o seguinte endereço: artedeserportugues.blog.pt
Terá mérito para se tornar num dos links publicitados aqui?
Obrigado.
Existe um Povo que, por algo novo implora.
Alguém sabe qual? Eu sei, nós sabemos, eles sabem.
Existe um Povo que questiona pela demora.
Alguém sabe qual? Eu sei, nós sabemos, eles sabem.
Este bravo Povo...
Como num barco à deriva, procuram altos e imponentes faróis.
O Povo está triste, revoltado e farto que o indecentemente pisem.
Perdendo a esperança e rezando por novos e distintos Heróis.
Pois estes Génios do Mal, nos olhos lhes fixam, falam e nada dizem.
O Povo procura sentimentos simples e verdadeiros.
Mas os Demónios continuam a prometer para depois nada fazer.
Um carente Povo anseia por novos e grandes feitos.
E continuam os Falsos Deuses, tirando tudo sem nada ceder.
Trespassam o Seu corpo, alimentando-se de suor e sangue.
Sugam o Seu livre espírito, deixando vazio a sua podre alma.
E depois pedem que o Povo se acalme, oiça e não se zangue.
Sabendo eles que o seu coração, no podre e sujo chão, salta.
Bem sabem eles que o Povo está farto da velha cantiga.
Eles sentem a Sua agonia, mas mesmo assim..., nem uma palavra amiga.
Mal sabem os Falsos Deuses e os seus amigos Demónios.
Que ao plantar a sua semente, estavam a germinar novos ódios.
Eles correm impacientes, inventando as suas teorias e conceitos.
Eles espalham a falsa palavra, ao sabor dos seus interesses do momento.
Cantam com um berrante maldizer, sobre os nossos bravos Guerreiros.
Fazendo os nosso valentes Pensadores, caírem num trágico esquecimento.
Existe um Povo, que descobriu a má sorte, que lhes saiu.
Alguém sabe qual? Eu sei, nós sabemos, eles sabem.
Existe um povo que pede sangue e Justiça a quem lhes traiu.
Alguém sabe qual? Eu sei, nós sabemos, ....eles bem sabem!!!
Olhem bem... Vejam lá no que se metem... essa coisa de defender a verdadeira democracia vai fazer com que a guarda "preto"riana destes nossos "amigos de extimação".... bom mais não digo... ai se o "povinho" sabe que se pode fazer uma coisa parecida, penso que vai haver muita guilhotina e muita cabeça ensanguentada a rebolar.
Estou a brincar, eh! eh! (Acho eu! De vez em quando acerto com cada uma !!!!)
Mais uma vez, faz-se juz ao nome dado a este blog, sem dúvida!
Eu não sou um intelectual, não sou tão culto como vós sois. Nunca li e continuo a não ler muito sobre política. Não entendo o JOGO. Parece que só consigo entender o sentimento provocado por certas e determinadas atitudes da política. Isso eu sou um "expert". Eu reparo bem no baixar de olhos quando vem mais uma novidade do nosso estimado "sistema". Quando uma criança pergunta: O que foi pai? Este responde: Nada minha filha, nada...
Ao Buiça,sim, porque não? Esta como está não me serve...
NC podes dizer-me onde encontrar as posições de Michels?
Ao VR e Luís Barata, passarei pelos respectivos blogs, o título "Pátria" é um bom começo para figurar nos links cá de casa.
Ao Sentinel,obrigado pelo momento poético e tão verdadeiro :)
Rebatet, de certeza que há muita coisa on-line. Em português sei que há pelo menos um livro sobre Robert Michels, editado pelo ISCSP. O prof. Marques Bessa também tem coisas escritas sobre Michels e Ostrogorski, penso que no livre "Quem governa?", mas não tenho a certeza. Sei também de um artigo na Análise Social, mas não me recordo do nº e não o tenho aqui comigo.
NC
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