domingo, fevereiro 26, 2006

O fim do primado político

Como apontou, e bem, Dominique Plihon, existem duas grandes forças motrizes no processo de globalização corrente, uma é a inovação tecnológica, símbolo máximo da nova economia do conhecimento, outra é a ascensão do “poder financeiro” a um estatuto de sustentáculo primordial do novo capitalismo global, aquilo que poderemos denominar especificamente por globalização financeira, ou seja, a crescente interligação dos mercados de capitais à escala mundial e a consequente interdependência crescente das economias nacionais.

Antes de mais é preciso situar historicamente o processo de globalização. A origem do fenómeno, como hoje o entendemos, encontra-se numa fase muito mais adiantada da História do que aquela que frequentemente é apontada como originária do processo. Na realidade é no século XIX, com a intensificação das trocas de mercadorias e capitais entre a Europa e o “Novo Mundo”, que a globalização, devidamente compreendida, tem início, com aquilo que Braudel chama a expansão da “economia-mundo”.

A primeira guerra mundial veio colocar um travão à expansão do mercado global e à hegemonia liberal. Esta interrupção do processo de globalização perdurou até ao surgimento da segunda guerra e no imediato seguimento desta com os anos dourados do Keynesianismo. Do pós-guerra havia surgido, pelo acordo de Bretton Woods, o sistema monetário internacional que perduraria até 1973, a partir daí generaliza-se a flutuação monetária. Isto foi o resultado da estagnação do crescimento económico, que parecia já não encontrar soluções nas velhas políticas públicas keynesianas, a par dos efeitos dos choques petrolíferos de 1973 e 1979 que aumentaram as pressões inflacionárias já existentes.

Para entender o que está por detrás das formas correntes da globalização e as forças que a impulsionam é preciso compreender o que se passou neste período. E aqui surge um dado fundamental, os credores e detentores do capital financeiro estavam a sofrer uma perda de riqueza causada pela queda das taxas de lucro e pela inflação.

É então que os poderes financeiros começam a fazer pressão sobre o poder político para uma alteração do modelo económico de forma a liberalizar e globalizar a economia, acabando com as restrições à expansão capitalista. O culminar, bem sucedido, destas reivindicações deu-se com a chamada revolução conservadora anglo-saxónica( não confundir com a Revolução Conservadora europeia de princípios diametralmente opostos) que levou ao poder os governos de Ronald Reagan e Margaret Tatcher e à transfiguração dos modernos partidos conservadores que passaram a ser, genericamente, “conservadores-liberais”, conjugação contra-natura nos desígnios e que está, em muito, na origem da derrocada do conservadorismo na vida política ocidental.

O novo paradigma representou o ressuscitar do liberalismo clássico, de Smith, Ricardo ou Mill, e passou a ser vulgarmente conhecido por neoliberalismo. Os seus ditames baseiam-se na ideia de que os Estados, ou os poderes públicos, não têm capacidade de gerir a economia, são inibidores do crescimento e é por isso necessário abrir toda a economia à iniciativa privada. Ao assumir que a toda a intervenção é prejudicial resulta que apenas um mercado financeiro completamente livre poderia assegurar a eficácia produtiva e o vigor económico.

O enquadramento normativo estabelece-se com a assumpção de que estas medidas resultariam numa melhoria do bem-estar a nível mundial e com a promoção de uma ideia que observamos amiúde nos círculos liberais, a de oposição entre a liberdade – sempre com uma dimensão estritamente individual -, representada pelas forças neoliberais, e um presumido totalitarismo do Estado, que procuraria conduzir o indivíduo em toda a sua acção.

Desta forma, estabelecidas as justificações teóricas e definido um enquadramento normativo, estavam asseguradas as condições para a cedência das comunidade políticas, nacionais, face aos interesses financeiros, cedência amparada por uma argumentação passível de legitimar perante a opinião popular o universalismo expansionista e desagregador da globalização.

Nas palavras de Dominique Plihon(2003), a doutrina neoliberal surge como fundamento do consenso de Washington, que é um conjunto de directrizes definidas pelos países do G7, posteriormente G8, com a entrada da Rússia, e que defende que o caminho desejável da economia:” passa pela abertura das fronteiras, pela liberalização do comércio e da finança, pela desregulamentação e pelas privatizações, pelo recuo das despesas públicas e dos impostos para benefício das actividades privadas, pelo primado dos investimentos internacionais e dos mercados financeiros, em suma, pelo declínio da esfera política e do Estado em benefício dos interesses privados”.

Este declínio traduz a submissão do poder político representante da comunidade nacional ao poder financeiro, que não conhece pátrias ou outras lealdades e interesses que não os do restrito e selecto grupo dos accionistas.

2 Comentários:

Blogger vs disse...

"...a expansão da “economia-mundo”."

Como resultado da Revolução Industrial e consequência óbvia de uma economia de mercado.

" O culminar, bem sucedido, destas reivindicações deu-se com a chamada revolução conservadora anglo-saxónica( não confundir com a Revolução Conservadora europeia de princípios diametralmente opostos) que levou ao poder os governos de Ronald Reagan e Margaret Tatcher e à transfiguração dos modernos partidos conservadores que passaram a ser, genericamente, “conservadores-liberais”,..."

No alvo. Está certíssimo.
Eu só lhe juntaria o sr.Helmut Kohl que, juntamente com os outros dois, foi um impusionador da 'revolução'.
O comunismo, até aí, ainda se foi aguentando. Bastou a nova postura (bem mais 'aguerrida') deste trio para não suportar a pressão e colapsar em 1989...completamente falido.
Os acontecimentos de 1989, como é óbvio, vieram dar mais 'velocidade' às reformas...pois que os oponentes se 'finaram'.

"O novo paradigma representou o ressuscitar do liberalismo clássico, de Smith, Ricardo ou Mill, e passou a ser vulgarmente conhecido por neoliberalismo."

EXACTO.

"...os Estados, ou os poderes públicos, não têm capacidade de gerir a economia, são inibidores do crescimento..."

O que é verdade.
Pelo menos, até agora, a experiência tem sido essa e os diversos 'estatismos' falharam todos de forma clamorosa.

"... estas medidas resultariam numa melhoria do bem-estar a nível mundial..."

Tal é correcto, desde que a globalização seja 'nivelada' por cima.
Neste aspecto há que não temer muiot ou ser particularmente pessimista.
Há 20 / 30 anos, os sul-coreanos, p.ex., ganhavam muito menos que os portugueses. Hoje...ganham mais.
O mesmo acontecerá com as novas potências emergentes, como a China ou a Índia. À medida que o mercado se for expandindo nesses países, passadas as 'dores do parto', eles começarão a subir a 'fasquia'.
O governo chinês que tenha cautela, pois a expansão capitalista, so far, tem sido muito adversa a sistemas monopartidários.
De uma maneira, ou de outra, acabam todos por dar o 'badagaio'.

Exemplo:
- O Rodrigo funda uma empresa.
Essa empresa, com o tempo, tem sucesso.O que começou por ser pequeno torna-se médio. Com o tempo começa a aumentar as suas perspectivas e a alargar 'horizontes'. Surgem oportunidades de negócios em outros países ou, até, a possibilidade de estabelecer uma filial, mesmo que pequena.
O Rodrigo ia 'auto-limitar' a sua própria empresa??

A dinâmica é esta. É a dinâmica básica da economia de mercado.
E é isto multiplicado pelos milhões de empresas que existem na Europa e no mundo.
Como se vê é uma dinãmica muito difícil de 'combater', pois espicaça características Inatas (logo, Naturais) do Homem, como o sentimento proprietário, o 'self-interest', a competição e a ambição.

Esta Revolução (começada em Inglaterra no séc.XIX) é muito simples , como vê.
Ao contrário dos comunistas que, durante décadas, tentaram moldar o Homem a algo de sumamente anti-natura....neste caso foi só por a 'cenoura' à frente, arranjar os meios e dar rédea completamente solta a características Naturais do Homem.
(o que, no limite, nos pode levar a uma situação 'manchesteriana' que urge evitar à outrance)

ps - as novas tecnologias, que estamos aqui a utilizar, têm um papel tremendo nisto tudo.
Sem a Revolução tecnológica de há 10/15 anos, nada disto seria concretizável de forma tão rápida.
Eu ainda sou do tempo em que ne sequer havia CD's, quanto amis computadores pessoais ou telemoveis....
Acho que percebeu a ideia.

6:11 da tarde  
Blogger PlanetaTerra disse...

///

COMBATER A PRIVATIZAÇÃO DO PLANETA

--- Isto não tem nada que saber!!!

--- Os Mega-Capitalistas - dotados de fortunas colossais - não estão somente interessados em 'Altos Lucros'... , eles estão também fortemente empenhados em lançar o CAOS no Planeta [ 1- Caos Social , 2- Caos Demográfico, 3- Caos Ambiental ]... para depois... poderem colocar um FIM à actual Civilização: a Civilização aonde existem Países no Planeta!...
--- De facto, enquanto o Planeta vai caminhando na direcção do CAOS... os Mega-Capitalistas ( Bieldbergs e Afins... ) vão-se posicionando... no sentido de 'TOMAR DE ASSALTO' O CONTROLO do Planeta: Com o fim do Serviço Militar Obrigatório, as Forças Armadas foram reduzidas a 'profissionais'... que irão trabalhar para quem lhes pagar mais... , e... com Mercenários muito bem pagos [ e dotados de armas de alta tecnologia - Armas Nucleares, Armas Quimicas, Armas Biológicas]... vai ser MUITO FÁCIL liquidar milhões e milhões... para que depois... os Mega-Capitalistas possam - a partir do CAOS... - erguer uma NOVA CIVILIZAÇÃO no Planeta:
---> um PLANETA PRIVADO... com Senhores Donos do Mundo -> um Neo-Feudalismo à escala global!!!... Aonde as pessoas serão controladas como 'animais de estimação' pelos Senhores Donos do Mundo...
[ NOTA: E os Sobreviventes irão APLAUDIR os Senhores Donos do Mundo!!!... Visto que... eles colocaram ORDEM numa situação de CAOS... -> quanto maior o Caos... maior irá ser a 'autoridade moral' dos Senhores da Nova Ordem no Planeta... ( "!!! os Privados é que vão saber tomar conta do Planeta !!!" -> é a teoria de que... o Planeta tem que ter um ('alguns'...) 'DONO DO PLANETA'... pois... será esse 'DONO DO PLANETA' que irá zelar pela Sobrevivência da Vida no Planeta Terra... ) ]



---> NOTA 1: Não nos devemos preocupar com a existência de SEPARATISMOS!!!... Pelo contrário, para COMBATER A PRIVATIZAÇÃO DO PLANETA, devemos dar TODO O APOIO àqueles que estão interessados em Combater o CAOS... ou seja... estão interessados numa ORDEM: a preservação da SUA Identidade num território!...


---> NOTA 2: Quanto maior for a situação de CAOS em que o Planeta vier a cair... maior irá ser a 'autoridade moral' dos Mega-Capitalistas... no sentido de ser exercido um controlo sobre as pessoas ( recorrendo a novas tecnologias... ) como se elas fossem uns meros 'animais de estimação'...
--- Portanto, Lutar contra a Privatização do Planeta... é... Lutar pela LIBERDADE das pessoas!!!...
--- Como é que se Luta VERDADEIRAMENTE pela LIBERDADE???
--- Resposta: É provando que em LIBERDADE... o Ser Humano possui a capacidade de constituir territórios de Ordem Social, de Responsabilidade Demográfica, de Responsabilidade Ambiental!!!

///

6:39 da tarde  

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