quarta-feira, maio 31, 2006

Futuro desfocado

A RTP emitiu nesta terça-feira uma reportagem intitulada «Quando a violência vai à escola»; um quadro negro do estado a que chegou este país, da cultura de total desrespeito pela autoridade – resultado prático de anos e anos de labuta ideológica árdua e permanente de marxistas, neo-marxistas e socialistas -, do processo de autêntica substituição populacional que está completado com sucesso em determinadas zonas de Lisboa( algumas das salas de aula mostradas na reportagem aparentavam não ter quaisquer alunos portugueses) e da mais-valia que a diversidade étnica tem trazido à nossa sociedade.

Para mim nada daquilo foi surpreendente e creio que só se espantou com o que ali foi mostrado quem não faz ideia do que é hoje a zona colonizada que foi outrora a capital de Portugal, ou porque vive fora de Lisboa, ou porque, vivendo em Lisboa ou arredores, não costuma andar de transportes públicos, tem os filhos em colégios particulares, vive em condomínios luxuosos, em zonas elitistas, enfim, consegue, de certo modo, por via de uma específica condição social, passar ao lado da realidade quotidiana da insegura e nauseabunda cidade.

Apreciei a preocupação da RTP em assegurar que em momento algum escola, alunos ou docentes pudessem ser identificados, desfocando as imagens da pequena barbárie que ia exibindo; agressões entre alunos, ameaças a professores, por parte dos «jovens» e dos respectivos pais, assaltos, assédio sexual a professoras, tudo o que se possa imaginar. Mas o essencial não pôde esconder, os marginais surgiam, ainda assim, facilmente identificáveis, todos percebemos quem são, são os que todos sabíamos que seriam; as eternas pobres vítimas de discriminação a quem tudo se desculpabiliza, para os quais tudo se justifica pelo chavão do «racismo» ou da «exclusão social» …

Talvez numa próxima oportunidade a RTP possa simplesmente fazer como João César Monteiro na sua obra «Branca de Neve», ecrã completamente negro permitindo apenas ouvir as vozes dos delinquentes. Haveria algo de simbólico nessa ideia do ecrã negro, negro como a mancha que alastra progressivamente por todo o país e que se abate sobre o nosso futuro.

Depois seguiu-se um debate... comecei a fazer zapping, havia acabado de jantar e achei melhor poupar a minha digestão às tretas das opiniões do costume, e de resto não precisava sequer de as ouvir, é por demais óbvio que o problema se resume à «exclusão social» e que a solução é colocar o «Zé Camelo» a sustentar com os seus impostos mais programas de integração, assimilação, inclusão, ou o que lhe decidam chamar, sobretudo não atacar o paradigma sagrado das nossas sociedades, nada de questionar a religião da multiculturalidade, que a nova Inquisição espreita e não perdoa.

Curioso estado o deste Estado, não pára de crescer, não pára de gastar e, no entanto, mostra-se incapaz de cumprir responsabilidades mínimas que lhe são necessariamente exigíveis, como fazer respeitar a autoridade. E mais grave, demitiu-se voluntariamente daquilo que, numa situação normal, ou não estivéssemos nós sob ocupação de forças anti-nacionais, seria uma das suas obrigações essenciais, defender e preservar a identidade da nação.

sábado, maio 27, 2006

Uma democracia carrilha

Nunca li um livro de Manuel Maria Carrilho e não faço tenção de ler algum, mas não deixo de reconhecer que a última obra do candidato derrotado à Câmara Municipal de Lisboa e a discussão pública que originou teve duas grandes virtudes. A primeira foi a confirmação das suas falhas de carácter: um homem que alega não ter cumprimentado um adversário político por se ter sentido gravemente ofendido na sua dignidade no decorrer de um debate e que, dias depois, cumprimenta sorridentemente o «ofensor», pousando para a comunicação social, é um homem com problemas de carácter. Quando optou por não cumprimentar Carmona Rodrigues pensou não estar a ser filmado, ou talvez não tenha, no imediato, reflectido sobre o impacto político que esse gesto causaria. Alertado pelos seus assessores para a má imagem pública que terá daí resultado achou por bem, agora com a consciência que estava a ser televisionado, cumprimentar o mesmo indivíduo que havia desferido o que considerou um «imperdoável» ataque à sua honra. O carácter de Carrilho tem, pois, momentos, conforme a agenda política.

Mas isso é de somenos importância, de qualquer forma nunca tive Manuel Maria Carrilho em grande conta, nem, para o efeito, a maioria dos nossos políticos. O homem, no fundo, não é nenhuma excepção à regra.

A segunda virtude foi a divertida e súbita controvérsia desencadeada pelo livro em torno da fiabilidade da «informação» veiculada pelos órgãos jornalísticos de «referência». Aparentemente existem «agências de comunicação» que controlam grande parte da «informação».Os estudos efectuados indicam que cerca de 70% das notícias publicadas nos jornais portugueses originam destas «agências de comunicação»,que podem estar ao serviço dos mais diferentes interesses, ou de gabinetes de imprensa de poderes públicos. Noutros países a tendência diminui, segundo uma reportagem do «Expresso», mas ainda assim mantém um peso significativo. Creio que o padrão se estenderá a todos os países ocidentais. Esta ausência de transparência entre interesses económicos e políticos e os «Media» não é novidade alguma. Christopher Lasch havia há muito identificado o problema como um dos factores de degeneração da democracia. A publicidade ou a propaganda, que originavam, de entre outras, precisamente de instituições do género destas «agências de comunicação» e gabinetes de assessoria, passavam cada vez mais como «informação objectiva» para a sociedade civil.

Quanto a mim não existe aqui uma perversão decisiva da democracia, essa vem muito detrás, é a democracia-liberal moderna que é em si uma degeneração política, a manipulação da comunicação e as relações dúbias que se estabelecem no quadro demoliberal entre informação e propaganda são uma natural característica do sistema.

O problema é que naquilo que hoje se convenciona chamar sistemas totalitários o controlo sobre a informação era claro ao passo que, como a democracia-liberal se publicita enquanto sistema pluralista, livre e transparente, esse controlo informativo tem de ser sujeitado a uma maquilhagem, a uma ilusão para venda ao público.

Sucede que a questão não se centra só na dita «informação objectiva» que se confunde amiúde com propaganda, é a própria «informação subjectiva», ou para ser mais claro, a «opinião», que é controlada nos «Media». Todos sabemos que as crónicas de opinião nos jornais ou os comentadores televisivos são seleccionados a partir de uma área bem delimitada que exclui uma parte das posições ideológicas, que não têm qualquer acesso à comunicação de massas e, por consequência, ao grosso da população. Estes sectores ideológicos não só são os mais vulneráveis à «propaganda-informação», porque não têm apoios financeiros nem poder político, como estão impedidos do acesso à comunicação social de forma a poderem exprimir-se pela sua voz.

Mas esta manietação informativa não é suficiente, apesar de tudo existem questões que fogem à «rede». E sobre essas torna-se cada vez mais claro que é também preciso actuar. Nesse caso é o próprio Estado que já não se coíbe de condicionar, implicitamente ou explicitamente, a informação e a opinião que deve ser disponibilizada à população.

É assim que se explica que o Ministério da Administração Interna (MAI) tenha exigido a responsabilização criminal dos dirigentes do Sindicato dos Profissionais de Polícia (SPP) que afirmaram a ligação, que é factual, entre imigração e criminalidade e as novas formas que esta tem vindo a assumir no nosso país, fruto das maravilhas da «diversidade multicultural». A intimidação como estratégia de controlo da informação e da opinião patrocinada pelo próprio Estado democrático… E é dessa forma que se explica que a CICDR, orgão do ACIME, que é um organismo governamental, financiado pelos contribuintes, tenha «aconselhado» recentemente os jornais a não publicarem a origem étnica dos criminosos, o mesmo é dizer que o Estado instigou a comunicação social a ocultar informação da população, no caso sobre a relação entre crime e etnia. Este não é um problema exclusivo de Portugal, nem um problema exclusivo das questões relacionadas com imigração e minorias étnicas.

Em França, o ministro da cultura, Renaud Donnedieu de Vabres, prepara um projecto, ainda mal esclarecido, para controlar a informação que circula na Internet, que se tem mantido até aqui como o único meio realmente livre de comunicação. Para além de outras implicações políticas que daqui poderão surgir convém lembrar que em França os sociólogos identificaram como uma das causas da rejeição da Constituição Europeia o trabalho desenvolvido pelos blogs e sites que se lhe opunham, fazendo um contraponto com o que era defendido nos «Media» tradicionais, onde as posições pelo sim tinham maior preponderância.

Numa altura em que alguns comissários europeus anunciam que o tratado constitucional será novamente levado a votação em 2009 não será irrelevante que se preparem projectos de controlo da informação na Internet precisamente num dos países onde o texto foi rejeitado. A escolha da data não é, obviamente, casual, coincidirá com um período em que se prevê que a economia europeia esteja já num processo de crescimento consolidado e em que, logicamente, a convulsão social será residual. Esta esperada estabilidade económica aliada a uma selecção daquilo que é disponibilizado como opinião e informação à população, condicionando a Internet, será a garantia (ou assim o esperam alguns) de que, desta vez, se votará «acertadamente».

No fundo a lógica subjacente a tudo isto é simples, o povo não pode emitir juízos de valor sobre informação que desconhece e tanto maior é a predisposição para a anuência quanto menor for o acesso à comunicação dissidente ou quanto maior for a exposição a propaganda disfarçada de «informação objectiva» e a crónicas de opinião criteriosamente escolhidas.

A democracia-liberal apregoa em público as suas virtudes únicas: a liberdade de expressão, a contraposição de opinião, o pluralismo político,a independência informativa, mas dissimuladamente – e por vezes nem tanto – vai impondo outras regras, garantindo um estranho conceito de liberdade e pluralismo na conformidade. Pois alguém julga possível haver real possibilidade de divergência quando a informação está condicionada? É exactamente a efectiva liberdade de informação e a sua independência, como o acesso aos meios de comunicação de massas por parte de diferentes forças políticas, que garantem tudo o resto. O carácter desta democracia é similar ao de Carrilho, em público apresenta uma face, na sua «esfera privada»( no caso a dos interesses económicos e políticos que a dirigem) tem outra. Uma espécie de «democracia carrilha»…

sexta-feira, maio 19, 2006

Reinterpretar Hans Freyer

Hans Freyer é um nome pouco conhecido entre aqueles que se destacam vulgarmente naquilo que chamaremos a direita revolucionária alemã do pré-guerra. Filósofo e sociólogo, foi o principal impulsionador da “Escola de Leipzig”, uma escola sociológica sedeada na Universidade da cidade com o mesmo nome e que, sob a direcção de Freyer, se pretendeu constituir como um “Think Tank” para o nacionalismo, reunindo nomes como Arnold Gehlen, Gunter Ipsen, Heinz Maus, Karl Heinz Pfeffer ou Helmut Schelsky.

Embora Freyer seja um homem frequentemente olvidado no panorama da Revolução Conservadora o seu trabalho influenciou parte do movimento nacional-revolucionário alemão e a sua visão política insere-se facilmente dentro dessa tradição. Pertenceu ao complexo espiritual que reagiu contra a ordem imposta pela democracia-liberal à época e pode ser considerado um dos expoentes da ideia de meta-política na Alemanha dilacerada pela primeira guerra mundial.

A influência da sua obra no nacionalismo alemão esteve confinada a alguns sectores, e vale a pena lembrar, porque é muitas vezes esquecido, que o nacional-socialismo não foi um movimento monólito. Não encontramos em Freyer um ressentimento anti-semita nem um enfoque primordial na questão racial per se, mas antes uma exaltação do Volk germânico como essência e agente do ideal político. O nacionalismo de Hans Freyer assenta num posicionamento moral de rejeição do mundo que via surgir e que, como tantos outros homens, encontrava na mundividência proposta pelo nacionalismo a alternativa revolucionária de enraizamento social, histórico e espiritual do homem num mundo cada vez mais marcada pela fragmentação liberal e ameaçado pela barbárie materialista proposta pelo comunismo.

Em Hans Freyer surge uma visão cíclica da História, expressa em “Der Staat”, que concebe 3 fases progressivas que se repetiriam, Crença, Estilo e Estado. Na última fase, o Estado, a sociedade atingiria o apogeu. O Estado surge aqui como a estrutura que agrega a comunidade histórica e cultural, ou nacional, na unidade, dando-lhe um sentido ancorado no passado e uma forma para a realização futura, protegendo a sua particularidade. A ideia de liberdade em Freyer está sujeita ao bem comum, a liberdade individual não pode actuar de forma a colocar em causa a harmonia da comunidade.

Esta concepção do Estado pode apenas ser entendida à luz de uma adaptação da herança Hegeliana da ideia de Estado ético. Em Hegel a vida ética está fundada em três instituições fundacionais: a família, a sociedade civil e o Estado. Freyer adopta a mesma concepção considerando a sociedade civil como coincidente com a comunidade primordialmente definida. O Estado, como em Hegel, assegura a unidade necessária que invalida o fraccionamento e a desordem social inerente ao individualismo mais radical e, dessa forma, é ao mesmo tempo o garante de uma concepção própria de liberdade. Esta posição de Freyer é anti-universalista, e uma vez mais regressamos a Hegel e à noção de que o Estado não pode ser ultrapassado por uma ordem mundialista porque tal como não pode existir um indivíduo sem outros indivíduos não pode existir Estado sem outros Estados, depositários da soberania e do poder político que representem as diferentes comunidades.

As 3 fases cíclicas da história que Freyer identifica em “Der Staat” são um resultado do conceito de “espírito objectivo”, que havia sido desenvolvido anteriormente em “Theorie des objektiven Geistes. Eine Einleitung in die Kulturphilosophie"(disponível em espanhol como “Teoría del Espíritu Objetivo”). Nessa obra identificamos uma abordagem da cultura que pode apenas ser plenamente entendida num contexto pré-determinado, o da sua própria realidade. A cultura surge como interacção, é produto de um povo mas é também geradora desse povo, tal como, naturalmente, as “formas objectivas” que assume: símbolos, arte, organização; o carácter da comunidade. Estas formas, depois de criadas, almejam o enraizamento na realidade que as rodeia. Esta cultura criada e criadora não pode nunca ser independente da psique que a produz, isto é, do espírito (objectivo) próprio do povo que lhe dá forma e que sob as suas formas evolui. Freyer identifica a ideia de tradição como uma configuração desse espírito objectivo, fortalecendo as bases para a coesão particular de cada comunidade. Podemos então identificar nessas “formas objectivas” de criação cultural, enquanto dispersas, o Estilo que antecede a fase posterior da História, o Estado, onde serão unificadas e harmonizadas.

É importante salientar que Hans Freyer é um construtivista e que a visão política exposta em “Der Staat” terá um cariz parcialmente utópico. Mas este carácter utópico da sua visão não é entendido na sua obra como um factor de limitação ou desmotivação perante um objectivo supostamente irrealizável, antes deve esse cunho utópico ser compreendido como móbil da busca da superação e da perfeição e como factor de inegável valor no desenvolvimento e aprimoramento do espírito humano. Isto significa que na impossibilidade de se concretizar o projecto na sua totalidade é possível tender para isso, e é possível alcançar algo que se aproxime do desígnio traçado.

A ideia de utopia em Freyer está intimamente ligada a uma ordenação política da sociedade que no seu estádio final atingiria a estabilidade. Esse estádio perfeito seria atingido na projecção do “3º Império”, marcado por um primor ético, que sucederia ao “2º Império”, caracterizado pelo dever Kantiano. Em Freyer a procura da sociedade ideal está sempre ligada à ideia de pátria e à sua salvaguarda, não existe procura do ideal para além da comunidade. As duas funções históricas da utopia, a crítica social e o construtivismo sistemático, podem apenas mover a sociedade em direcção ao aperfeiçoamento quando estão localizadas espacialmente e centradas numa realidade cultural particular.

Da sua reflexão sobre a utopia, e porque não existem sociedades perfeitas, podemos retirar que a aproximação à boa sociedade exige 3 condições:

1- Um equilíbrio das forças que actuam na sociedade para constituir uma ordem funcional que exige que a comunidade se saiba fechar ao exterior quando uma abertura implica uma alteração da sua estrutura;
2- Alcançado o sistema ideal(ou o que dele se aproxima) este deve ser protegido de uma transformação;
3- A comunidade política não pode ser resultado de uma mera imposição jurídica para se manter agregada, o que significa que exige uma uniformidade à priori.

Apesar da influência de Hegel sobre Freyer ser também comum aos marxistas a visão de Freyer é extremamente crítica do Marxismo, sobretudo do determinismo económico, que ele rejeita. Também opostamente a Marx, Freyer, como já vimos, não tem por objectivo o desaparecimento último do Estado, pelo contrário, vê aí a concretização da união da comunidade e a partir do qual nasceriam as mais elevadas formas de cultura(1).

Essa rejeição do determinismo económico marxista baseia-se numa interpretação distinta da História, porque se no marxismo ela é determinada pelos factores económicos em Freyer é o “político” e não o “económico” que explica o curso histórico. E a rejeição resoluta da primazia económica afasta-o, igualmente, do liberalismo.

Esta diferença no entendimento das forças motrizes da História explica a “dialéctica Freyeriana”. Ao passo que no Marxismo a posição materialista justifica que a acção de transformação social sobre a História seja encarada no contexto da luta de classes, e portanto de uma comunidade dividida pelo económico, cujo elemento actuante, ou se preferirmos, o agente de transformação, é a classe proletária, em Hans Freyer o agente de acção, aquele sobre o qual recai a necessidade de actuar sobre a História é o Volk, o povo, a comunidade, que necessariamente precisa de se percepcionar como uma realidade unida pelo mesmo substrato, com um objectivo de realização comum, e não como um conjunto de indivíduos divididos pelo mercado ou apenas ligados por relações que derivam daí.

Se a revolta marxista é ditada por uma concepção economicista da realidade, o desencanto "Freyeriano" ultrapassa largamente essa dimensão, é uma reacção espiritual face a um mundo desenraizado, onde a nação surge fragmentada pela filosofia liberal, ameaçada pelo comunismo, dividida pelas lutas partidárias em prol de interesses próprios que não os da comunidade. É no contexto do advento dessa nação cada vez mais desintegrada, cada vez menos orgânica e afastada da sua memória histórica que Freyer afirma a urgência do mito como factor estruturante da pátria: o nascimento num povo particular deve ser elevado a um destino ou vocação conscientemente afirmada(2).

Notas:

(1)Esta visão Hegeliana do papel do Estado na ordem política é comum a algumas correntes fascistas, provavelmente aquelas que mais apropriadamente se podem assim denominar, e vale a pena aqui lembrar as palavras de Mussolini:”Tudo no Estado, nada fora do Estado, nada contra o Estado”. Na prática o corporativismo fascista não realizou esta ideia e assim somos remetidos para a procura da utopia em Hans Freyer, entre o projecto ideal ambicionado e o realizado existe o confronto com a contingência, que provoca a necessária adaptação, mas os princípios subjacentes podem, não obstante, ser largamente realizados. É a aproximação ao ideal que só é conseguida quando é a plenitude que se ambiciona.

(2)Relembrando um seu contemporâneo,Carl Gustav Jung:"O sentido torna muitas coisas suportáveis, talvez tudo.Nenhuma ciência substituirá o mito e o mito não pode ser construído a partir de qualquer ciência.Porque não é que Deus seja um mito mas que o mito é a revelação de uma vida divina no homem"

Referências:

Jerry Z. Muller,"The Other God that Failed : Hans Freyer and the Deradicalization of German Conservatism",Princeton University Press,1988

Hans Freyer,"Teoría del Espíritu Objetivo",Editorial Sur,1973

terça-feira, maio 16, 2006

Divulgue e contribua



Porque ver um sorriso no rosto de uma criança é uma das formas de nos ver sorrir, o PNR inicia, no próximo dia 10 de Maio, uma campanha de recolha de brinquedos para as nossas crianças carenciadadas.
Consideramos que não é só no Natal que se devem organizar este tipo de actividades, e como tal, resolvemos fazer as crianças um pouco mais felizes também em outras alturas do ano.
As associações a quem vamos entregar os brinquedos recolhidos serão rigorosamente seleccionadas.
Aos Portugueses lançamos o convite: quem tenha disponibilidade para doar brinquedos de filhos, sobrinhos, netos ou outras crianças ou queira adquirir um brinquedo, seja de que valor for, e participar nesta campanha, o PNR agradece.
Vamos pôr um sorriso no rosto de cada uma das nossas crianças.

Para mais informações visitar esta página do site do PNR

*Actualização: Os brinquedos recolhidos nesta campanha do PNR serão entregues ao Retiro Aboim Ascenção, dirigido por Luís Villas-Boas.

sábado, maio 13, 2006

Prós e Prós - texto de desintoxicação

Quem assistiu ao programa Prós e Prós da passada segunda-feira pode considerar-se um privilegiado. Bem sabemos que por norma o programa é uma exposição de indigência intelectual, mas creio que pode ter ultrapassado todos os limites nesta última sessão. Há muito que não via reunidos no mesmo espaço tantos estúpidos em defesa do fim de Portugal, há muito que não via tamanha manipulação informativa em horário nobre da televisão que é financiada com os nossos impostos.

Por onde começar quando, durante mais de duas horas, assisti a todo o tipo de intrujices, imagináveis e inimagináveis, por parte de uma Irene Barata que é autarca, um ex-comissário europeu, um sociólogo que deu pena, um comissário para a imigração que é um autêntico «Miguel de Vasconcelos» dos tempos que correm e um padreco cujo nome não recordo mas que avivou na minha memória a razão pela qual considero hoje a Igreja Católica uma instituição de tendências neo-marxistas…

Talvez seja melhor começar pelos pontos menos negativos; foram tão poucos que serão rápida e facilmente abordados. O sociólogo Rui Pena lá disse a custo que a imigração não é uma solução sustentada para os problemas sociais e demográficos do país no médio-longo prazo. António Vitorino subscreveu esta afirmação e acrescentou que para lá dos «aspectos positivos» este fenómeno acarreta também custos, embora aparentemente se tenha esquecido de os focar, uma vez que durante todo o programa assistimos a uma apologia incontestada da imigração. E pronto…quanto ao que de minimamente proveitoso foi dito em mais de duas horas de programa ficámos já conversados. Passemos então a uma sucinta análise crítica das intervenções dos protagonistas.

Irene Barata, uma história mal esclarecida

Comecemos pela intervenção da autarca em foco… A senhora Irene Barata ter-se-á queixado de não conseguir encontrar trabalhadores portugueses dispostos a irem para Vila de Rei. Isto conduz-nos, antes de mais, a uma questão que ultrapassa o caso específico de Vila de Rei. Se de facto existem empregos que não conseguem trabalhadores, se existem empresas que por mais que tentem não conseguem mão-de-obra e se temos pessoas que preferem continuar a viver do subsidio de desemprego a aceitar trabalho então a discussão terá de ser situada ao nível das reformas do subsídio de desemprego, sujeitando-o a regras de activação mais exigentes e excluindo do seu acesso quem as não cumpra. No entanto, este caso particular levanta também questões sobre a lógica de funcionamento dos próprios centros de emprego, importa saber a quem disponibilizam informação sobre a procura de trabalho e segundo que critérios. Porque francamente, num país com cerca de 500 mil desempregados ninguém acredita que a autarquia não estivesse em condições de atrair alguns portugueses…

Mas a questão não fica por aqui, vamos supor, para efeito de discussão, que de facto Irene Barata não conseguiu encontrar pessoas dispostas a trabalharem em Vila de Rei pelas condições oferecidas…

Passou no programa a ideia de que Irene Barata acumulará a função de presidente da Câmara com um cargo numa grande empresa do concelho e sabemos que estão a ser criados no município um centro de lazer com capacidade para 300 utentes e dois lares para idosos, com capacidade para 70 utentes cada um, ou seja, estão na forja alguns projectos que necessitarão de uma quantidade razoável de mão-de-obra e de preferência a baixo custo. É importante saber qual a eventual ligação da autarca, a existir, a estes investimentos, que são privados, segundo as palavras da própria.

Porque quando Irene Barata se queixa de não conseguir trazer gente para o concelho, com emprego garantido, é preciso também dizer que o emprego garantido de Irene Barata paga o salário mínimo, se a senhora Barata não pudesse importar imigrantes os empresários( incluindo-a a ela?) que necessitassem de mão-de-obra, no caso de a não conseguirem encontrar ao salário oferecido, teriam de aumentar esse valor salarial para atrair trabalho, dispondo da possibilidade de importar mão-de-obra estrangeira a senhora autarca prestou às empresas envolvidas um valioso serviço(em oposição aos interesses dos eventuais trabalhadores): poderem contar à priori com trabalho remunerado ao nível mais baixo que a lei permite. Será portanto relevante saber se Irene Barata tem de facto ligações a uma das maiores empresas do concelho e conhecer que tipo de relações existirão eventualmente por parte de todos os envolvidos nesta história às empresas por detrás destes novos investimentos, interessadas concerteza em dispor de mão-de-obra ao mais baixo custo.

Todas estas questões devem ser analisadas para que este assunto possa ser devidamente clarificado, o que não é de forma alguma normal e aceitável é que poderes públicos importem imigrantes num país que tem meio milhão de desempregados. E mais, a autarquia de Vila do Rei não está apenas a importar trabalhadores estrangeiros para o seu concelho como se se tratasse de uma realidade desligada do resto da nação, que não afecta os portugueses como um todo. Estas pessoas vêm com contratos de 3 anos, renováveis por mais 3, ao fim dos quais poderão adquirir nacionalidade portuguesa. Ora não só a mobilidade destas pessoas não pode ser efectivamente controlada, já que não há nada que garanta que ao fim desse tempo não abandonarão Vila de Rei, como no processo, por diligência desta presidente de Câmara, o país ganhará mais uns quantos novos portugueses.

Comissário Rui Marques, sempre ao serviço da anti-nação

Deste senhor não podemos esperar grande honestidade na análise do problema da imigração já que é pago pelo Estado para fazer a apologia do fenómeno, e, verdade seja dita, tem-no feito por todas as formas ao seu alcance, particularmente manipulando informação.

Comecemos por uma das afirmações da noite, quando Rui Marques afirmou, com a convicção de quem sabia à partida que não iria ser contestado( o painel oferecia-lhe essa garantia), que não existia qualquer relação entre criminalidade e imigração e que as taxas de criminalidade dos imigrantes eram similares às dos portugueses se levados em consideração os factores idade, ocupação e género.

Rui Marques fez uma objectiva distorção da questão. O que o Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas afirmou é que, descontados os factores sexo, idade e ocupação, os números relativos de delinquência seriam semelhantes entre imigrantes e população autóctone, porque os homens adultos, mal remunerados ou desempregados, apresentam taxas de violação da lei superiores aos outros grupos, e estes constituem a maior parte dos imigrantes. Mas a verdade é que de facto os números da criminalidade imigrante ultrapassam os dos portugueses, e enquanto os lobbies imigracionistas não conseguirem trazer para a Europa mais mulheres, mais trabalhadores altamente qualificados e enquanto os terceiro-mundistas com 6 ou 85 anos de idade não forem uma percentagem significativa dos imigrantes, essa correlação crime/imigração continuará a ser uma realidade que nenhum Alto Comissariado conseguirá esconder. Portanto a ligação entre os dois fenómenos é indesmentível e pode aliás ser facilmente comprovada analisando a percentagem de imigrantes detidos nas nossas prisões, que ultrapassa a taxa de imigrantes presentes na população do país.

Mas ainda assim, será verdade que descontados os factores sexo, ocupação laboral e idade os níveis de criminalidade dos imigrantes correspondem aos dos portugueses? Não propriamente, uma vez que essa análise está adulterada à partida. Isto porque o estudo em que o Alto Comissário para a Imigração e Minorias Étnicas se baseou para referir essas percentagens, que supostamente fariam equivaler as taxas de crime dos portugueses às dos imigrantes, contabiliza como crimes de nacionais os que são praticados pelas minorias étnicas entretanto naturalizadas, fazendo aumentar a respectiva taxa de delinquência dos portugueses e diminuir a das minorias, em última análise se a todos os imigrantes for assegurada a nacionalidade portuguesa( e já estivemos mais longe) a taxa de criminalidade desse grupo cairá para 0%. Se quiséssemos pois estudar devidamente o problema seria necessário fazê-lo discriminando entre grupos étnicos, impensável em Portugal mas prática corrente noutros países. Louve-se então o desvirtuamento do critério de nacionalidade que os sucessivos governos têm levado a cabo neste país.

Finalmente o senhor comissário esqueceu-se convenientemente de outro ponto não menos importante. É que a criminalidade engloba uma miríade de situações de violação da lei, das mais graves às menos significativas. Se analisarmos a distribuição dos crimes verificaremos que os de natureza mais gravosa têm uma incidência percentual superior entre as minorias étnicas. Não é propriamente equivalente um português passar um cheque sem cobertura e um não europeu alvejar alguém com uma arma de fogo no curso de um roubo. Sucede que o comissário Marques nunca apresenta estes dados.

Particularmente caricata foi a tentativa de Rui Marques de definir o que seria a identidade europeia. Na ânsia de defender que a actual vaga de migrações para a Europa não constituiria qualquer ameaça à nossa identidade o comissário definiu-a, balbuciando uma série de frases sem grande nexo mas com alguma graça, como caracterizada pela «diversidade e diferença», ao mesmo tempo ligando a identidade das nações europeias ao actual monstro jurídico que conhecemos por U.E., construção que, como sabemos, é recente, e terminou a série de disparates dizendo que antes de falar em identidade europeia lhe interessa sobretudo falar em «humanidade», o tipo de frase que cai sempre bem em auditórios cuja capacidade de raciocínio não prima pelo brilhantismo.

Ninguém coloca em causa o conceito de «humanidade», não creio que alguém duvide que os diferentes povos do mundo fazem parte da espécie humana, mas isso não invalida que dentro da humanidade existam diferenças identitárias a preservar e que enriquecem o mundo; e elas sim garantem a verdadeira diversidade. Assim, um português é diferente de um sueco como um europeu é diferente de um africano, todas estas distinções estão marcadas por factores de identidade que devem ser preservados sem no entanto implicarem que se renegue a quem quer que seja a pertença à «humanidade».

A identidade ancestral europeia não pode obviamente ser confundida com os valores propugnados pela superestrutura denominada U.E., nada é mais absurdo, e certamente que as características fulcrais da identidade dos povos europeus não são nem nunca foram a «diversidade e a diferença», que não passam de uma construção social moderna e que quanto muito poderiam ser apontadas como a própria negação de factores identitários.

O que ficou claro na intervenção do comissário foi a completa incapacidade de definir o que constitui a identidade das nações europeias, simplesmente não sabe o que isso significa, não lhe interessa, não tem conhecimentos históricos para a caracterizar ou mostra-se incapaz de o fazer em função de propósitos políticos e ideológicos ao serviço dos quais se encontra. Para que não restem dúvidas os povos europeus são, em traços largos, de raiz indo-europeia na sua quase totalidade, de raça «branca», fruto do encontro da cultura greco-latina com o cristianismo, unidos pela proximidade geográfica e cultural e por processos históricos directa ou indirectamente partilhados, e tudo isto faz com que possamos correctamente definir a Europa como um bloco civilizacional.

Rui Pena, o sociólogo esquerdista de serviço

As declarações deste participante não fugiram à mediocridade das dos restantes convidados e de resto o referido indivíduo é conhecido pela sua filiação ideológica à esquerda e pelo empenho, assumido, na defesa da agenda multiculturalista.

Entre os inúmeros disparates proferidos pela personagem alguns merecem especial atenção. A dada altura, negando que a imigração/invasão que assola a Europa possa constituir uma desagregação da identidade dos povos europeus e de Portugal em particular comparou o actual fenómeno de imigração com a recepção de milhares de retornados vindos das nossas antigas províncias ultramarinas. Comparar o regresso a Portugal de portugueses, que sempre o foram independentemente de se encontrarem fora do território continental europeu, que partilhavam connosco o sangue dos nossos antepassados, a mesma cultura e tradição, com a entrada desregrada de imigrantes estranhos à Europa e que nada têm a ver com a nossa identidade bio-cultural não merece comentários, fica exposto e à consideração de todos a legitimidade de semelhante comparação.

Depois Rui Pena afirmou que a actual vaga migratória para a Europa não é significativa em termos históricos uma vez que em séculos anteriores os fenómenos de migração atingiram dimensões superiores, dando o exemplo da emigração europeia para o Novo Mundo. O que Rui Pena se esqueceu de referir foi que a esse processo se chamou, apropriadamente, colonização, e de facto, se pretende estabelecer um paralelismo com o que está a suceder na Europa esse seria o termo que deveria ter empregue e que decorreria naturalmente da lógica do seu raciocínio. Mas ao contrário dos referidos processos de colonização, que compreenderam a oposição dos povos colonizados, vencidos pela superioridade técnica dos colonizadores, na situação actual a Europa está a ser colonizada por povos que são, quanto muito, civilizacionalmente inferiores e que não disporiam das condições para levar a cabo essa empreitada se não contassem com a colaboração do poder político e económico do Ocidente, que atraiçoa as suas populações e chega mesmo a impedir a reacção destas através de mecanismos de condicionamento legal.

Finalmente Rui Pena chegou ao cúmulo de afirmar que a imigração para a Europa apresentava números insignificantes em termos absolutos, espantosa declaração quando não são os números absolutos que aqui interessam porquanto sabemos que em toda a Europa Ocidental os números relativos da invasão face às populações autóctones se situam já em percentagens elevadíssimas, de tal modo que entre imigrantes legais, ilegais e naturalizados, na quase totalidade dos países do Oeste europeu mais de 10% da população é já de origem estrangeira e maioritariamente não europeia. É caso para perguntar a partir de que valores começam estes números a ser um factor de destruição das identidades dos povos europeus para Rui Pena, nos 25%? Nos 50%? Ou pura e simplesmente não há limite? Deveremos tão-somente abdicar voluntariamente da defesa da nossa herança colectiva, erguida sob o sangue dos nossos antepassados, num processo induzido a partir de cima e consentido na base por populações anestesiadas que caminham voluntária ou inconscientemente para a sua morte?

António Vitorino e as meias verdades

A intervenção de António Vitorino no programa ficou marcada pela divulgação de algumas ideias que merecem aqui ser complementadas, uma vez que, criteriosamente, o ex-comissário europeu se limitou a passar meias verdades, tolhendo a informação que não lhe interessava passar mas que, não obstante, necessita ser rematada.

A dada altura Vitorino referiu que a distribuição espacial da imigração pelo território nacional não se processava da mesma forma para os diferentes grupos de imigrantes que Portugal, e a Europa, recebem. É verdade. E é também verdade que são os grupos que tendem a concentrar-se nas zonas urbanas que implicam maiores custos( sobretudo de dimensão social) para o país. Mas chegado aqui teria sido interessante se António Vitorino tivesse, uma vez que as estruturas da U.E. conhecem estas realidades, dito claramente quais são os grupos étnicos que propendem a criar as maiores pressões sociais sobre as zonas urbanas e as suas periferias. Uma dica… não são os provenientes da Europa de Leste.

Falando sobre o problema demográfico António Vitorino referiu a necessidade de criar uma estrutura de apoio social que permitisse a execução de medidas de estímulo à natalidade e apontou como exemplo, como sempre sucede, o modelo de Estado Providência escandinavo. Falou em particular da urgência de implementação de medidas estatais que imponham a paridade, incentivando a igualdade entre homens e mulheres no mercado laboral e nos papéis parentais.

Aqui torna-se necessário abordar alguns pontos que ficaram por dizer na intervenção de Vitorino. Sabemos que o modelo de Welfare escandinavo é uma espécie de vaca sagrada para socialistas e social-democratas, que o tomam por exemplo de excelência nas análises comparadas com os modelos liberais e continentais. Mas é preciso referir também que os modelos de Estado Providência desses países estão em mutação e num processo de abertura ao mercado por imperativos de competitividade e, sobretudo, é importante perceber que os resultados desses modelos sobre a demografia não são muito melhores que os dos restantes, a ponto de mesmo nos países escandinavos não estar assegurada a taxa de natalidade que garante o nível de substituição da população, isto é, o problema subsiste também aí.

Quando falamos em diferentes modelos de Welfare, com particular ênfase no escandinavo, surge normalmente à discussão o trabalho daquele que será talvez o maior especialista no campo, pelo menos no que ao exemplo nórdico diz respeito, Esping-Anderson. No seu mais recente estudo Esping-Anderson propõe uma reforma do modelo social que estimule a natalidade precisamente focando a inserção da mulher no mercado laboral através do que chama uma nova política de género, implementando políticas centradas na criança, ao nível das creches e dos horários escolares, por exemplo, e na ideia de um novo conceito de contrato de trabalho. No essencial aquilo que António Vitorino defendeu no Prós e Prós para estimular a natalidade europeia foi uma reprodução quase textual das medidas que encontramos nesse trabalho de Esping-Anderson, o que não tem grande significado para além de nos levar a concluir que a Comissão Europeia tem esse estudo, e os que se situam nessa linha, por modelo para a Europa. Nada do que Vitorino ali defendeu é novo ou produto da sua meditação. Mas, uma vez que achou por bem reproduzir as conclusões desse estudo ou dos seus similares, com o ar de quem estava ali a apresentar medidas revolucionárias nunca antes ponderadas e saídas do seu génio, não pude deixar de notar a omissão de um pequeno «pormaior»…

É que os especialistas que analisam as propostas de Esping-Anderson, repetidas no programa por António Vitorino, concordam que esse modelo social, muito generoso e abrangente, está dependente da homogeneidade e do grau de coesão das sociedades. Ou seja, o Estado social propugnado por Esping-Anderson é apenas possível em sociedades onde, precisamente, não impera a «diversidade» e o «multiculturalismo», onde o laço de solidariedade social germina de um profundo sentimento de identidade e similaridade etno-cultural. De resto são vários os estudos sociológicos e económicos que concluem que nas sociedades multiculturais não existe apoio por parte das populações a um Estado Providência abrangente, precisamente derivado da percepção que as transferências de rendimento que esse modelo implica beneficiam grupos étnicos distintos. Essa é aliás a razão apontada por trabalhos publicados em revistas especializadas para a inexistência de apoio popular a um modelo social de tipo escandinavo nos EUA – a existência de grupos raciais distintos em proporções consideráveis.

Temos assim que o ex-comissário Vitorino conseguiu a proeza de fazer a defesa de ideias que provêm de um modelo social que assenta a sua eficácia no pressuposto de sociedades homogéneas ao mesmo tempo que fazia a apologia da imigração, que é o factor principal de corrosão dessa homogeneidade das nações, sobretudo quando falamos de imigrantes pertencentes a grupos étnicos afastados dos das populações receptoras. Exaltou o Welfare State escandinavo, seleccionando as ideias de Esping-Amderson para a resolução do problema demográfico simultaneamente minando as bases que permitiriam o funcionamento eficaz desse modelo. Bravíssimo!

Finalmente e a propósito do comentário de uma anterior convidada do mesmo programa, historiadora e por sinal de esquerda, que terá dito que a Europa é «branca e cristã», o Dr. Vitorino afirmou que não lhe interessava nada se a Europa, devido à imigração, continuasse «branca» ou não. Esta afirmação vinda de um antigo comissário europeu é especialmente gravosa e relembra-nos por que razão não há hoje sombra de dúvida de que a U.E. é uma estrutura construída sem qualquer respeito pelos Estados nacionais e sem qualquer interesse em defender a identidade europeia; é na verdade o paradigma da destruição das nossas nações e da nossa herança histórica enquanto povos do Velho Continente.

O que está em causa aqui, nesta afirmação de António Vitorino, não é nem a apologia do racismo nem a sua rejeição, como se poderia apressadamente concluir. É tão simplesmente a constatação de um facto inegável, os povos europeus são, sem excepção, caucasianos. Ao afirmar que não lhe interessa que a imigração altere esse facto, Vitorino está a dizer que lhe é indiferente que a Europa continue a ser maioritariamente habitada por europeus ou não, que Portugal continue a ser habitado por portugueses ou não. A que estado chegaram as nações europeias para que um indivíduo que ocupou importante cargo na U.E., que hoje, infelizmente, controla grande parte da nossa soberania, afirme isto com o maior desprendimento e até com um mal disfarçado orgulho, que nível de decadência atingimos quando quem nos governa não receia manifestar o desprezo pela continuidade das nações europeias enquanto tal. Nos países da Ásia e da África, ciosos da sua identidade, declarações deste tipo seriam impensáveis, na Europa já não há limites, já não se esconde sequer a falta de vontade de sobrevivência, não há desejo de superação, de recuperação de uma grandeza perdida, é quem nos governa que declaradamente nos cospe em cima com um estúpido sorriso nos lábios, perante auditórios repletos de patetas alegres, também eles sorrindo perante o anúncio do seu óbito...E sempre a mesma pergunta ecoando na mente daqueles (poucos) de nós que por qualquer estranho desígnio do destino se vão mantendo lúcidos num mundo de cobardes abdicantes: para que sacrificaram a sua vida os que caíram nos campos de batalha que ergueram as nossas nações? Como chegámos a isto?

O padre da Obra Católica Portuguesa das Migrações

Não me alongarei nos comentários à participação do padre católico de serviço, de quem honestamente não recordo o nome. Achei simplesmente absurda a sua intervenção, pela forma, conteúdo, mas também por ter sido a duplicação do discurso proferido pelo Bloco de Esquerda alguns dias antes sobre o caso do Bairro da Torre e reproduzido na edição do «Expresso» do passado sábado por Daniel Oliveira. O Padre, cheio de indignação, mostrou-se chocado com a forma e os meios utilizados pela PSP na recente intervenção no Bairro citado; inconcebível, afirmou, que as forças policiais tenham desencadeado uma operação com tantos recursos para um desfecho que resultou «apenas»( termo seu) na apreensão de 19 armas. E como se não bastasse a desproporção de forças policiais ainda sujeitaram os pobres imigrantes ao estigma público da criminalidade, sem razão alguma, já se vê, quando poderiam ter levado a cabo uma intervenção mais «discreta», menos «agressiva», mais «amigável».

Pois bem, esclareçamos primeiramente o seguinte: Nessa operação policial foram apreendidas 19 armas de fogo, 500 munições, 22 carregadores e 2 silenciadores, isto para que a informação surja completa. Mas falta dizer ainda que vários moradores da zona se haviam queixado repetidamente da ocorrência de tiroteios no bairro com alguma regularidade. Ainda que o número de agentes envolvidos possa ter sido desproporcionado, 600 homens, e convém dizer que nós não sabemos que tipo de informação motivou aquela rusga, o que me parece francamente anedótico é que a preocupação principal da Igreja Católica( não tanto do B.E. porque todos sabemos o que essa organização representa) tenha sido a «mácula» provocada na imagem dos imigrantes, uma vez mais apresentados como vítimas perante a diabolização das forças da ordem, e não a segurança dos cidadãos e dos agentes que tantas vezes, ao entrarem nesses bairros de pacíficos e sacrificados imigrantes, acabam, cravejados de balas, na morgue. É então pouca coisa encontrar 19 armas de fogo , 500 munições, 22 carregadores e 2 silenciadores? Talvez para quem não arrisca a própria vida de cada vez que entra nesses locais, como o referido padre ou os bloquistas enraivecidos; para o cidadão comum e, sobretudo, para os agentes da autoridade, a apreensão desse armamento pode significar várias vidas que se salvam. Entre a inquietação com a imagem dos residentes e o risco de vida que pende sobre os polícias nas operações nesses pacíficos bairros onde, como bem sabemos, impera uma lei própria, a minha preocupação, como a de qualquer indivíduo que ainda mantenha uma réstia de sanidade, será sempre para com a segurança pública e a dos polícias que a garantem. Questões de perspectiva, calculo…A imagem deixada pelo representante da Igreja Católica é um retrato fiel do que é hoje essa instituição, mais um vírus, entre tantos outros, que corrói a identidade nacional.

Multiplicam-se os inimigos da nação, os inimigos da Europa, silenciam-se as últimas forças vivas que a defendem, manipula-se a informação, selecciona-se o que é dado conhecer às populações, mente-se, distorce-se, tudo vale… e propagandeado em horário nobre na televisão pública, o irónico toque final neste triste espectáculo. Permaneçamos nós com a bandeira hasteada perante a horda que tudo controla, alicerçados na força da nossa convicção!

sexta-feira, maio 05, 2006

Sobre a Revolução Conservadora

Quando o termo «Revolução Conservadora» é usado na Europa é sobretudo no sentido que lhe deu Armin Mohler no seu famoso livro «Die Konservative Revolution in Deutschland 1918-1932». Mohler apresentou uma longa lista de autores que rejeitaram os pseudo-valores de 1789( desprezados por Edmund Burke como meros «blue prints»), exaltaram o papel do «germanismo» na evolução do pensamento europeu e recolheram a influência de Nietzsche. Mohler evitou, por exemplo, conservadores puramente religiosos, fossem católicos ou protestantes. Para Mohler a marca essencial da «Revolução Conservadora» era uma visão não linear da História. Mas ele não toma simplesmente a visão cíclica do tradicionalismo. Depois de Nietzsche, Mohler acredita numa concepção esférica da História. O que significa isto? Isto significa que a História não é simplesmente uma repetição dos mesmos padrões com intervalos regulares nem um caminho recto que conduza à bem-aventurança, ao fim da História, ao paraíso na terra, à felicidade, etc., mas que se assemelha a uma esfera que pode girar (ou ser empurrada) em todas as direcções, de acordo com os impulsos que receba de fortes personalidades carismáticas. Tais personalidades carismáticas dirigem o curso da História através de algumas vias muito particulares, vias que não estão previamente fixadas pela mão da providência. Neste sentido, Mohler nunca acreditou em doutrinas políticas universalistas mas sempre em tendências particulares e pessoais. Tal como Jünger, queria lutar contra tudo o que fosse «geral» e apoiar tudo o que fosse «particular».Mais, Mohler expressou a sua visão das dinâmicas particulares usando o algo invulgar termo «nominalismo».Para ele, «nominalismo» era a expressão que melhor indicaria como as personalidades fortes seriam capazes de abrir novas e originais vias para si e seus seguidores na floresta da existência.

As principais figuras do movimento foram Spengler,Moeller van den Bruck e Ernst Jünger ( e o seu irmão, Friedrich-Georg).Podemos acrescentar a este triunvirato os nomes de Ludwig Klages e Ernst Niekisch. Carl Schmitt, como advogado católico e constitucionalista, representa outro aspecto importante da chamada «Revolução conservadora».

Spengler ficará como o autor de um brilhante fresco das civilizações mundiais que inspirou o filósofo britânico Arnold Toynbee. Spengler falou da Europa como civilização fáustica, melhor representada nas catedrais góticas, a intersecção da luz e das cores dos vidrais, as tormentas de neve com nuvens brancas e cinzentas de muitas pinturas holandesas, inglesas e alemãs. Esta civilização é uma aspiração da alma humana face à luz e ao auto-compromisso. Outra importante ideia de Spengler é o conceito de «pseudo-morfose»:Uma civilização nunca desaparece completamente depois de uma decadência ou uma conquista violenta. Os seus elementos passam à nova civilização que lhe sucede e formatam-na em direcção a caminhos originais.

Moeller van den Bruck foi o primeiro tradutor alemão de Dostoievski. Deixou-se influenciar profundamente pelo diário de Dostoievski, que continha severas críticas ao Ocidente. No contexto alemão, depois de 1918, Moeller van den Bruck advogava, com base nos argumentos de Dostoievski, uma aliança russo-germânica contra o Ocidente. Como podiam os respeitáveis cavalheiros alemães, com uma imensa cultura artística, mostrar-se a favor de uma aliança com os bolcheviques? Os seus argumentos foram os seguintes: durante toda a tradição diplomática do século XIX a Rússia foi considerada o escudo da reacção contra todas as repercussões da Revolução Francesa e contra a mentalidade e modos revolucionários. Dostoievski, enquanto antigo revolucionário russo que mais tarde admitiria que a sua opção revolucionária fora um erro, considerava mais ou menos que a missão da Rússia no mundo era apagar na Europa o rasto das ideias de 1789.Para Moeller van den Bruck a revolução de Outubro de 1917 foi apenas um cambio de vestes ideológicas: A Rússia continuava a ser, apesar do discurso bolchevique, o antídoto à mentalidade liberal do Ocidente. Derrotada, a Alemanha deveria aliar-se a esta força anti-revolucionária para se opor ao Ocidente, que aos olhos de van den Bruck, é a encarnação do liberalismo. O liberalismo, expressa Moeller van den Bruck, é sempre a doença terminal dos povos. Após algumas décadas de liberalismo um povo entrará inexoravelmente numa fase de decadência final.

O caminho seguido por Ernst Jünger é sobejamente conhecido. Começou como um ardente e galante jovem soldado na primeira guerra mundial, saindo das trincheiras sem qualquer pistola, apenas com uma granada de mão, manejada com a mesma elegância com que um típico oficial britânico usava a chibata. Para Jünger, a primeira guerra mundial foi o fim do pequeno mundo burguês do século XIX e da «Belle Époque», onde toda a gente era «como devia ser», isto é, comportando-se de acordo com normas estabelecidas por professores ou sacerdotes, exactamente como hoje temos de nos comportar de acordo com as auto-proclamadas regras da «correcção política». Debaixo das «tempestades de aço» o soldado podia afirmar a sua insignificância, o seu mero ser biológico, mas esta afirmação não podia, a seu ver, levar a um pessimismo inepto, ao medo e desespero. Havendo experimentado o mais cruel dos destinos nas trincheiras, debaixo do bombardeamento de milhares de armas de artilharia que sacudiam a terra, vendo tudo reduzido ao «elementar», o soldado de infantaria conheceu melhor que outros o atroz destino humano sobre a face da terra. Toda a artificialidade da vida civilizada urbana surgiu de repente como pura impostura. No pós guerra, Ernst Jünger e o seu irmão Friedrich-Georg, tornam-se os melhores escritores e jornalistas nacional-revolucionários. Ernst evoluiu para uma espécie de cínico, irónico e sereno observador da humanidade e dos factos da vida. Durante um bombardeamento sobre um subúrbio parisiense, onde as fábricas estavam a produzir material de guerra para o exército alemão, na segunda guerra mundial, Jünger ficou aterrorizado com a anormal rota aérea, recta, tomada pelas forças norte-americanas. A linearidade das rotas aéreas sobre Paris era a negação de todas as curvas e sinuosidades da vida orgânica. A guerra moderna implicou a destruição dos ondulantes e serpenteantes traços do orgânico. Ernst Jünger começou a sua carreira como escritor fazendo a apologia da guerra. Depois de haver observado os irresistíveis assaltos dos B-17 americanos ficou totalmente enojado pela falta de nobreza da forma puramente técnica de conduzir uma guerra. Depois da segunda guerra mundial, o seu irmão, Friedrich-Georg, escreveu o primeiro trabalho teórico que levaria ao desenvolvimento do novo pensamento alemão crítico e ecologista,«Die Perfektion der Technik»(A Perfeição da Técnica).A ideia principal deste livro, em meu entender, é a crítica da «conexão».O mundo moderno é um processo de intenções de conexão das comunidades humanas e dos indivíduos a grandes estruturas. Este processo de conexão destrói o princípio da liberdade. És um pobre operário acorrentado se estás conectado a uma grande estrutura, ainda que ganhes 3000 libras por mês, ou mais. És um homem livre quando estás completamente desconectado desses enormes tacões de aço. Em certo sentido Friedrich-Georg escreveu a teoria que Kerouac experimentou de forma não teórica escolhendo largar tudo e viajar, convertendo-se num cantante vagabundo.

Ludwig Klages foi outro filósofo da vida orgânica contra o pensamento abstracto. Para ele a principal dicotomia era entre Vida e Espírito(Leben und Geist).A vida é esmagada pelo espírito abstracto. Klages nasceu no norte alemão mas migrou enquanto estudante para Munique, onde passou o seu tempo livre nos pubs de Schwabing, local onde artistas e poetas se encontravam( ainda hoje).Tornou-se amigo do poeta Stefan Georg e um estudante da figura mais original de Schwabing, o filósofo Alfred Schuler, que acreditava ser a reencarnação de um antigo colono romano nas terras do Reno. Schuler tinha um genuíno sentido teatral. Disfarçava-se com a toga de um imperador romano, admirava Nero e montava peças evocativas do antigo mundo grego ou romano. Mas para além da sua faceta fantasiosa, Schuler adquiriu uma importância cardinal na filosofia desenvolvendo, por exemplo, a ideia de «Entlichtung», ou seja, o gradual desaparecimento da Luz desde o tempo das antigas cidades-estado da Grécia ou Roma. Não há progresso na História: Pelo contrário, a Luz está a desaparecer como a liberdade do cidadão para definir o seu próprio destino. Hanna Arendt e Walter Benjamin, na esquerda e no campo conservador-liberal, foram inspirados por esta ideia e adaptaram-na para audiências diferentes. O mundo moderno é o mundo da completa escuridão, com pouca esperança de encontrar períodos «iluminados» novamente, excepto se personalidades carismáticas, como Nero para Schuler, dedicadas à arte e a um estilo de vida dionisíaco, marcassem uma nova era de esplendor que duraria apenas o tempo abençoado de uma primavera. Klages desenvolveu as ideias de Schuler, que nunca escreveu um livro completo, depois da morte deste em 1923 devido a uma cirurgia mal conduzida. Klages, pouco antes da primeira guerra mundial, pronunciou um famoso discurso na colina Horer Meissner, na Alemanha Central, para os movimentos da juventude (Wandervogel).Este discurso teve o título de «Homem e Terra» e pode ser visto como o primeiro manifesto orgânico de ecologia, com uma clara e compreensível, mas sólida, base filosófica.

Carl Schmitt começou a sua carreira como professor de direito em 1912 e viveu até à respeitosa idade de 97 anos. Escreveu o seu último ensaio aos 91.Não posso enumerar todos os pontos importantes do trabalho de Carl Schmitt neste espaço. Resumamos dizendo que Schmitt desenvolveu duas ideias principais, a de decisão na vida política e a de «Grande Espaço». A arte de moldar a política em geral ou uma boa política em particular está na decisão, não na discussão. O líder tem de decidir para liderar, proteger e desenvolver a comunidade política de que está à frente. A decisão não é ditadura como diriam hoje em dia muitos liberais na nossa era do «politicamente correcto».Pelo contrário, uma personalização do poder é mais democrática, no sentido que um rei, um imperador ou um líder carismático é sempre um mortal. O sistema que ele eventualmente imponha não é eterno, já que ele está condenado a morrer como qualquer ser humano. Um sistema nomocrático, ao invés, procura eternizar-se, mesmo se os acontecimentos correntes e inovações contradizem as suas normas ou princípios.O segundo grande tópico no trabalho de Schmitt é a ideia de Grande Espaço Europeu (Grossraum). As forças externas devem ser impedidas de interferir nesse Grande Espaço.Schmitt queria aplicar à Europa o mesmo princípio simples que animava o presidente norte-americano Monroe. A América aos americanos.Ok, dizia Schmitt, mas apliquemos a ideia de Europa aos europeus. Schmitt pode ser comparado aos «continentalistas» americanos, que criticaram a intervenção de Roosevelt na Europa e na Ásia. Os latino-americanos também desenvolveram similares ideias continentalistas, tal como os imperialistas japoneses. Schmitt deu a esta ideia de Grossraum uma forte base jurídica.

Niekisch é uma figura fascinante no sentido em que começou a sua carreira como líder comunista no «Conselho da República da Baviera» de 1918-19, que foi destruído pelos Freikorps de von Epp, von Lettow-Vorbeck, etc. Obviamente Niekisch ficou desapontado pela ausência de uma visão histórica entre o trio bolchevique na Munique revolucionária (Lewin, Leviné, Axelrod).Niekisch desenvolveu uma visão euroasiática, baseada na aliança entre a União Soviética, a Alemanha, a China e a Índia. A figura ideal que deveria ser o motor humano desta aliança seria o camponês, adversário da burguesia ocidental. Um certo paralelo com Mao Tse-Tung surge aqui evidente. Nos jornais que Niekisch editou descobrimos todas as tentativas alemãs de apoiar movimentos anti-britânicos ou anti-franceses nos impérios coloniais ou na Europa (Irlanda contra a Inglaterra, Flandres contra uma Bélgica francófona, nacionalistas hindus contra o Reino Unido, etc.).

Robert Steuckers

Crónica cinematográfica - Terra sem Rei

Quiçá porque o homem foi separado das suas raízes, porque o conduziram a um mundo mecanizado onde perdeu a noção dos ciclos lunares, do sentir da Terra e suas estações, e quiçá porque desviaram os seus olhos do Sagrado, agora a figura de um rei surgido da bruma, um rei no cimo de um cavalo e com a autoridade de uma espada forjada pelo Destino e pela História, nos interpela e comove.

O vazio não pode ser eterno. Assim, nas nossas alienadas sociedades, nas nossas urbes dominadas pelo lixo e pelo fumo, a espada daquele Rei anuncia-nos o Retorno do Mito.

O sentimento que a história do Rei Artur nos provoca não é, no entanto, novo. Tanto “Gladiador”, como “Braveheart” e a insuperável trilogia de “O Senhor dos Anéis” já nos haviam levado a redescobrir quem são os europeus. Em todas essas histórias está latente o mesmo espírito fáustico e cavalheiresco. A luta do homem europeu por alcançar um Destino, ainda que sabendo da inutilidade da batalha, arriscando a vida, apostando nela a sua palavra.

A palavra, a “Honra”. Esse é o grito que nos percorre como uma corrente eléctrica de cada vez que é pronunciado por Artur ou os seus cavaleiros.

Quiçá a Europa, nestes tempos de tormenta, de ameaças de guerras devastadoras, precise apetrechar-se de novo de espíritos sem medo, na força que dá o compromisso com o Sagrado e com a História.

O retorno dos valores que estão latentes na epopeia celtica-cristã de Tolkien fez com que alguns dos seus protagonistas tenham aberto os olhos para uma necessidade de combate cultural pelo que consideram a essência da sua identidade enquanto europeus. O popular Gimli, interpretado por John Rhys-Davies, declarava em Janeiro deste ano na revista World Magazine:« Penso que Tolkien anuncia-nos que as gerações terão que fazer frente a um desafio e que se não despertam para fazer frente a esse desafio perderão a sua civilização». Consciente da gravidade das suas palavras – em que falava da beleza e grandiosidade da cultura europeia – acrescentava:«Pode ser que esteja a enterrar a minha carreira com declarações como esta, e isso é doloroso, mas penso que há questões prioritárias que exigem respostas honestas».

E o actor que interpreta Aragorn( também o rei que retorna - como Artur - ) afirmava este ano:«Sou celta e escandinavo, cresci entre os mitos nos quais Tolkien se inspirou em “O Senhor dos Anéis”.É parte da minha herança».

Herança que “O Rei Artur” nos projecta. Um mundo agonizante apresenta-se aos nossos olhos mas onde, não obstante, a esperança é possível. O seu tempo presencia a queda de uma ordem e a incerteza de uma nova era. Artur, rei, traz Vontade e Espírito. Ainda que é ali que a história perde credibilidade pelos erros que introduz, já que não existia Inquisição naqueles anos nem certeza da afiliação de Artur à heresia de Pelagio.

Na história que se nos narra surgem-nos muito longínquas aquelas projecções de Hollywood de lânguidas damas esperando desvigorados cavaleiros.À sua vista também nos parece wagneriana e excessiva a “Excalibur” de Boorman.

“O Rei Artur” – como essas outras películas que citámos como precedentes de ressurreição de um cinema heróico com raízes na cultura europeia – deixa-nos, no final, de novo nas ruas das nossas urbes, com a música maravilhosa de Hans Zimmer soando no nosso interior e com uma palavra repercutindo: Honra.

Se foi assim para muitos – como foi para o autor deste comentário –, já foi suficiente. Porque o destino aguarda-nos entre as brumas e, como o cavalo de Galahad, procura-nos…de novo.

Carlos Martínez-Cava Arenas,"El semanal digital", 5 de Setembro de 2004