Com a ascensão de Reagan ao poder iniciou-se o período dourado do neo-liberalismo, ou pelo menos é com este aspecto mais visível da administração Reagan que usualmente nos familiarizamos mais facilmente. Porém, a grande transformação que a administração Reagan simbolizou foi a de uma importante viragem nos meios ditos conservadores americanos. Na realidade foi com a administração Reagan que se começou a desenhar nos EUA o surgimento do movimento que é hoje conhecido por neo-conservadorismo. É ali, na presidência Reagan, que se encontram os fundamentos do intervencionismo constante dos Estados Unidos em várias partes do mundo e o início do fenómeno globalista.
Ao contrário do que sucedia com as anteriores presidências Republicanas, Reagan passou a estar rodeado de um grupo de conselheiros distantes do conservadorismo tradicional e com uma abordagem diferente da política externa americana, dos quais talvez se destaque Jeane Kirkpatrick; enquanto tradicionalmente a direita americana verdadeiramente conservadora defendia com intransigência os regimes que lhe eram aliados ou serviam os seus interesses e a sua mundividência, mesmo independentemente da natureza desses regimes, os neo-conservadores que começaram a surgir como conselheiros de Reagan defendiam uma atitude diferente; a de intervir no exterior para mudar a natureza dos regimes e torná-los um reflexo dos valores supostamente defendidos pelos EUA. Aqui se traça a primeira diferença óbvia entre os neo-conservadores e os conservadores tradicionais americanos já que para poder justificar a intervenção sobre regimes externos se começou a difundir a ideia de que o fariam para defesa de valores como a democracia, a liberdade e os direitos humanos, no fundo a mesma cantilena que ouvimos hoje a Bush, também ele rodeado do “lobby” neo-conservador.
O neo-liberalismo surge assim como a expressão económica de uma visão política global do mundo, não necessariamente nos seus aspectos estritamente económicos mas na sua intransigente defesa da “mundialização” de valores em ordem a poder funcionar produtivamente.
Leo Strauss, um autor muito do agrado de alguns conservadores, viria a representar um papel importante no novo rumo que o conservadorismo americano assumiria. Curiosamente Strauss ensinou na Universidade de Chicago, local de expansão do actual «mainstream» do pensamento neo-liberal. Paul Wolfowitz será talvez o “straussiano” mais conhecido na actual administração Bush, mas está longe de ser o único, nomes como Abram Shulsky, John Walters, Leon Kass juntam-se ao clube e homens como Irving Kristol e Norman Podhoretz, os teóricos centrais do neo-conservadorismo americano e também eles estudiosos de Strauss, marcam enquanto estrategas políticos a agenda Bush. O pensamento de Leo Strauss sofre claras influências da filosofia de Maquiavel e Platão, da sua crítica da democracia, do ênfase colocado na necessidade de existência de elites intelectuais capazes de conduzir as massas, da necessidade de que as elites saibam mentir de forma a controlar e manipular a população.Esta é também em si uma visão maquiavélica da política. Olhando para a actual presidência Bush encontramos ali estes ensinamentos levados à letra, a argumentação em torno da urgência da intervenção no Iraque foi toda ela construída sobre um aglomerado de mentiras e de manipulações da opinião pública. Não falo só da mentira sobre a existência de armas de destruição maciça mas também da forma como alguns meios de comunicação social norte-americanos foram manietados pela administração Bush por forma a instalar na população americana a ideia de que era do interesse nacional americano o derrube do regime iraquiano. Os lobbies neo-conservadores fizeram um tal trabalho que a dada altura mais de 60% dos americanos estavam convencidos do interesse nacional desta intervenção. Hoje, reconhecidamente, o Iraque é um local fora de controlo e ninguém sabe o que fazer ou que equilíbrios sairão dali. Nesta altura será interessante notar que Leo Strauss, como algumas das figuras que influenciou, com especial destaque para Paul Wolfowitz e os principais pensadores do neo-conservadorism, Irving Kristol e Norman Podhoretz, são todos judeus, sendo que Strauss foi durante parte da sua vida um reconhecido sionista.
Uma das características mais marcantes dos neo-conservadores e que os afasta dos conservadores tradicionais americanos, conhecidos agora por paleo-conservadores, é a sua intransigente defesa da necessidade dos EUA terem uma política externa de intervenção agressiva no mundo, como atrás referi, usando constantemente o argumento sempre politicamente correcto da defesa dos direitos humanos e da democracia. Os paleo-conservadores são profundamente anti-intervencionistas, são nacionalistas e não escondem a sua proximidade à defesa da ideia de identidade europeia dos Estados Unidos. No entanto, um olhar mais atento sobre a intervenção global dos EUA no mundo sob a influência neo-conservadora não deixa de levantar questões importantes sobre a real intenção por detrás destas políticas e da pertinência dessas intervenções ou dos interesses que realmente defendem. Como relatei atrás foi durante a administração Reagan que os neo-conservadores iniciaram a sua escalada de poder no seio do partido Republicano, sobretudo pelo papel definidor da política externa desempenhado por Jeane Kirkpatrick e Richard Perle, este último também um judeu .Essa influência neo-conservadora é hoje quase total na presidência Bush e é a tendência dominante no interior do partido Republicano, levando muitos paleo-conservadores a abandonar o referido partido. As intervenções da administração Bush reflectem bem a convergência de duas influências principais; por um lado os lobbies económicos que se encontram representados em Washington por homens como Dick Cheney, ex-funcionário da Halliburton, empresa com interesses no ramo energético( logo petrolífero) ou Condoleezza Rice antiga directora da Chevron, mais uma empresa do sector petrolífero, um outro caso bem mais conhecido será o do Grupo Carlyle, que tem beneficiado escandalosamente com a guerra ao terrorismo desencadeada à escala global e que conta com membros dentro da administração Bush(embora a influência deste grupo se tenha estendido às próprias administrações Democratas), por outro lado temos os interesses geopolíticos de Israel representados pelos neo-conservadores e que têm guiado a política externa dos Estados Unidos em convergência com os interesses óbvios do Estado de Israel. Trata-se da evidente constatação da avassaladora influência dos judeus americanos no despontar e crescimento do neo-conservadorismo até à actual hegemonia política nos sectores supostamente ligados à direita. Convém então analisarmos o que representa realmente esta nova espécie de “republicanos” conhecidos por neo-conservadores, quem são e o que defendem…
Irving Kristol e Norman Podhoretz são antigos liberais e democratas que apoiaram Martin Luther King e o movimentos dos direitos civis e que foram editores da revista “Commentary”, um magazine do Comité Judaico Americano que apoia ferozmente Israel, opõe-se à constituição de qualquer estado palestiniano e que tem defendido uma política externa americana desdenhosa em relação à Europa bem como a intervenção unilateral dos EUA para o derrube de regimes hostis a Israel, nomeadamente no Iraque, Irão, Síria, Líbano, Jordânia, Arábia Saudita, Egipto e Líbia. Entretanto estes homens converteram-se em “conservadores” e tornaram-se os grandes teóricos do movimento neo-conservador, mas as suas origens políticas estão sem dúvida radicadas na esquerda americana e isto serve para definir o que representa na realidade o neo-conservadorismo: um desvio da direita tradicional americana da sua matriz original. Não há que ter ilusões, as proveniências políticas e pessoais destes teóricos do neo-conservadorismo são patentes nas características deste novo conservadorismo que entretanto tomou de assalto as estruturas do GOP e montou uma rede de instituições que se constituíram como os “think tanks” das administrações republicanas definindo as estratégias políticas da direita, deixando os paleo-conservadores órfãos de representação política e social e que são generalizadamente controladas pelo lobby judeu norte-americano.
Os neo-conservadores têm assumido um papel ainda de maior destaque desde o 11/9 e estão por detrás da determinação da política externa americana que daí surgiu, defendendo uma visão unilateral e de supremacia americana no mundo, desvalorizando a cooperação e a aliança diplomática com a Europa e privilegiando as relações com Israel. A mulher de Kristol, Gertrude Himmelfarb é ela própria uma das estrategas neo-conservadoras de maior relevo nos EUA e uma militante defensora dos interesses do Estado de Israel, o filho de ambos, William Kristol é o editor da Weekly Standard, uma revista referência do pensamento neo-conservador e é também o fundador do «Projecto para o Novo Século Americano» uma das instituições com mais poder político nos Estados Unidos, da qual saem muitos dos decisores da política externa americana que integram as administrações republicanas e que tem sido o centro difusor da estratégia de dominação global norte-americana. Desta instituição saem inúmeros quadros que formam o núcleo duro do pensamento político da actual “direita” americana.
O «Projecto para o Novo Século Americano» tem as suas instalações no mesmo edifício que serve de sede ao poderoso AEI (American Enterprise Institute) um “think tank” onde homens como Richard Perle assumem um papel de destaque e onde predomina o lobby judeu.
Foi a partir do AEI que personagens como Perle, Douglas Feith(que foi o nº 3 no Pentágono), e David e Meyrav Wurmser(membro do Instituto Hudson,neo-conservadora e nascida em Israel ) escreveram em 1996 um relatório para o partido israelita Likud( que seria liderado por Netanyahu) onde se explicava como quebrar o processo de paz de Oslo e se aconselhava a invasão do Iraque como o primeiro passo para o estabelecimento da hegemonia israelita no Médio Oriente. David Wurmser, um defensor de longa data de uma aliança incondicional com Israel, foi conselheiro de John Bolton no Departamento de Estado norte-americano, este último agora nomeado pela administração Bush para embaixador nas Nações Unidas. Uma enormíssima coincidência terá sido a invasão sem pretexto real do Iraque por parte dos EUA, ou então talvez o culminar do poder real deste lobby judeu e a demonstração clara do que significa realmente o neo-conservadorismo, escolham a hipótese que preferirem…
Mas as estranhas ligações do lobby judeu ao movimento neo-conservador e ao poder em Washington atingem ainda mais ramificações; a mulher de Dick Cheney, Lynne Cheney também faz parte do AEI. Dick Cheney, entretanto, certamente em mais uma incrível coincidência, convidou Victoria Nuland para sua conselheira em Defesa Nacional, ora a senhora Nuland é casada com Robert Kagan, co-fundador do «Projecto para o Novo Século Americano» com William Kristol. Kagan e o seu pai, também ele um ex-liberal convertido em neo-conservador, têm sido vozes activas na reivindicação de que o actual orçamento do pentágono não é suficiente para a criação de uma desejada e incontestável supremacia absoluta dos EUA no mundo por via do poderio militar.
Quando se fala na necessidade de considerar na presente conjuntura os EUA como aliado da Europa é importante que os nacionalistas europeus entendam que não será nunca com a actual América que isso será desejável. Os aliados naturais da Europa nos EUA, aqueles que podem representar de facto uma plataforma de entendimento e aliança entre Europa e EUA são os paleo-conservadores, nunca os denominados neo-conservadores que dominam por completo a política externa contemporânea americana e o descaracterizado Partido Republicano. O neo-conservadorismo que transformou a direita americana numa estranha caricatura é anti-europeu de raiz, liberal nas origens e sionista nos objectivos, advoga aliás claramente uma supremacia norte-americana sobre o mundo e a Europa em particular e a utilização dos europeus ao serviço dos interesses globais dos EUA e de Israel. Os factos não deixam margem para dúvidas. É preciso que o paleo-conservadorismo americano, que é nacionalista, defensor de uma identidade matricial europeia dos EUA, contra o poder monopolista das grandes corporações e anti-globalista, consiga reabilitar-se e reconquistar o seu espaço, essa luta é imperiosa para o futuro da própria Europa e da verdadeira civilização ocidental, porque é aí que se encontram os aliados naturais do Velho Continente.